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Friday, January 04, 2008

Virtual Realidade Parte 118


Luísa olhava o namorado com adoração. Quando Eduardo se voltou a sentar à mesa perguntou-lhe:
─ Amor, que sorriso lindo é esse? Boas notícias?
─ Eu acho boa: a nossa amiga Cátia acabou de ligar para nos desejar um bom Natal e dizer que está felicíssima porque o namorado foi almoçar lá a casa com os pais.
─ Pois, fico muito feliz por ela; o seu sonho realizou-se. Basta-nos acreditar, que tudo é possível. ─ disse emocionada falando da sua amiga virtual.
Tinha sido através do Eduardo que elas se tinham conhecido e feito uma bonita amizade. Acompanhara aquele namoro desde o início e sempre lhe deu força para lutar por ele.
─ Mãezinha, não queres contar a história dela?
─ Não sei se interessará.
─ Eu penso que sim, que todos os presentes gostariam de a conhecer. É mais um exemplo de como a Internet é uma óptima coisa. Afinal esses dois encontraram-se e apaixonaram-se graças a ela!
─ Mas isso já não é novidade. ─ disse Rui, olhando para Cristina sentada a seu lado ─ Pois não, amor?
─ Mas este caso é muito especial. Se todos estiverem de acordo eu gostaria de o contar. ─ pediu Eduardo.
─ Eu ia-te pedir isso precisamente. ─ disse Luísa.
─ Conta! ─ pediram todos, curiosos por saber do que se tratava.
Eduardo começou:
─ Cátia é o nome dela e foi-me apresentada por uma outra amiga virtual que me avisou que era uma menina especial derivado à sua deficiência particular. Com o passar do tempo aprendi a conhecê-la. Quase sempre bem-disposta e com conversas perfeitamente lúcidas, passava também por momentos de algum desânimo. Nas primeiras vezes em que isso aconteceu contou-me das suas dificuldades funcionais e o grande receio que tinha do futuro, porque até para as exigências fisiológicas mais normais precisava de ajuda.
─ O que tem essa rapariga afinal? ─ perguntou a mãe de Luísa.
─ Ela é deficiente motora. Sofre de Distrofia Muscular Congénita do tipo Merosina Negativa, em termos técnicos para quem entender.
─ Eu entendo um pouco. ─ disse Rita.
Os outros ouvintes permaneceram calados esperando mais explicações.
─ Em suma, uma cadeira de rodas especial é o seu único modo de locomoção, o que lhe dá uma autonomia de movimentos muito limitada em relação a nós.
─ Pobre rapariga! ─ lamentou a mãe de Luísa.
─ Eu não diria isso! ─ ripostou Eduardo. ─ ela não se sente como tal. Imaginem um mundo em que todos éramos assim: ninguém se sentiria inferior, nem sequer incomodado. Somos nós, os ditos normais, com o nosso olhar de estúpida piedade, que fazemos com que muita dessa gente se sinta inferior.
Luísa apertou o braço do namorado, como quem diz que não faça caso das palavras da mãe. Não queria que aquilo desse origem a um mal entendido entre os dois.
─ Conta do telefonema agora. ─ pediu ela.
─ Pois ela começou a confiar em mim, logo de início, pelo apoio que lhe dava e um dia apresentei-a a Luísa. E assim temos uma bela amizade.
─ É verdade e eu também gosto muito dela! ─ exclamou Luísa.
─ Sente-se que é cheia de força, de vontade de viver, sempre pronta a ajudar quando precisamos dela e feliz quando tem oportunidade de o fazer. Temos andado, mais ou menos, a par dos altos e baixos pelos quais tem passado nestes últimos tempos. Agora acabou de me contar do namorado, que o ama e é correspondida.
─ Que bom! ─ exclamou Rita.
─ Conheceram-se no IRC,─ continuou Eduardo ─ há uns tempos atrás, mas nessa altura ele namorava com outra. Com o convívio diário nasceu entre eles uma grande afinidade que os levou a não poderem passar um dia sem se falarem. José, percebendo o que se estava a passar, afastou-se, deixando de aparecer e Cátia sofreu muito com isso pois tinha-se apaixonado por ele. Passados uns meses ele voltou a aparecer e recomeçaram a partilhar alegrias e tristezas até que ele lhe pediu namoro. Era o que ela mais queria e não se fez rogada; aceitou logo.
Durou apenas um mês. José começa a tomar conta da realidade, das deficiências de ambos. Seria muito complicado para eles por serem os dois deficientes. Deixou-a e desapareceu do IRC. A Cátia pareceu-lhe que o mundo tinha desabado. Não queria acreditar que o destino não a deixava ser feliz como os outros jovens ditos normais. Era no meu ombro que vinha desabafar as suas mágoas.
─ Ele tem o mesmo mal que ela? ─ perguntou o pai.
─ Também é deficiente motor, mas de Paralisia Cerebral
─ Que idade têm? ─ quis saber Rita.
─ Penso que a Cátia tem 27 e o namorado 28.
Entretanto o almoço tinha terminado. As crianças pediram licença para se levantarem e foram ver um filme que passava na televisão, os adultos ficaram sentados à mesa atentos ao resto da história.
─ Continua! – Pedia Emília muito compenetrada.
─ Passaram-se dois anos. Cátia ainda teve alguns namoricos mas nada de importante. Até que voltou a encontrar José e reataram o namoro. Ela tem medo de voltar a sofrer e perguntou-lhe se eram verdadeiros os sentimentos dele. Ele acabou por lhe confessar que nunca deixou de pensar nela. Apenas achou que seria melhor para ela, naquela altura, e que merecia ser feliz, encontrar alguém que tomasse conta dela. Mas o destino voltou a juntá-los. E, pelo que me acabou de dizer ao telefone, finalmente as famílias já se conhecem e estão todos juntos e felizes.
Sandrine fez sinal a Eduardo que queria fazer uma pergunta.
─ Eles têm algum curso? Trabalham?
─ Ambos tiraram o 12º na área de administração. Ela agora é recepcionista e ele é desenhador multimédia. Ambos têm trabalho.
─ Andam os dois numa cadeira de rodas? ─ perguntou a mãe de Luísa.
─ Cátia sim. Anda sempre com a cadeira e precisa de ajuda permanente. A DMC é uma doença que, aos poucos, vai ganhando terreno, ou seja, a pessoa vai perdendo as capacidades físicas, ficando mais dependente.
Ela fazia uma vida quase normal quando andava. Por exemplo, fazia a cama e tomava banho sozinha; agora precisa de ajuda para tomar banho e não faz a cama nem outras coisas. Por falta de força, por falta de reflexos e por atrofiamento (prisão dos tendões). A Paralisia Cerebral é uma perturbação do controlo da postura e movimento que resulta de uma anomalia ou lesão não progressiva que atinge o cérebro em desenvolvimento.
Pelo pouco que sei do José, ele é uma pessoa praticamente normal, com algumas limitações e, por isso, necessita sempre de uma terceira pessoa. Quem o ajuda é a mãe, mas pode-se dizer que é quase independente. Trabalha num local onde há pessoas ditas normais e o patrão adora-o. Anda pela casa e só usa cadeira quando se desloca a grandes distâncias.
Esta é a história destes dois jovens que têm todo o direito à felicidade como qualquer um de nós. Precisam de muito apoio dos pais, dos amigos e da sociedade em geral.Um caso para reflexão e uma lição de vida, que nos faz ver quão mesquinhos somos quando nos preocupamos com ninharias sem importância.
Continua...

13 Comments:

Blogger Miguel Augusto said...

Interessante tema! E bem verdade infelizmente as pessoas são descriminadas por muito pouco. Já assisti a coisas verdadeiramente revoltantes...
Isto das doenças é complicado, mas acreditem que quando se tem uma doença é óptimo que saibamos qual é, é muito mais frustrante quando o relatório nada diz sobre a doença...

9:09 pm  
Blogger tb said...

Sim... quando nos preocupamos com ninharias sem importância....
Há mundos que são tão mais importantes do que a mesquinhês do pensamento pequeno.
Enfim..., tema que dá "pano para mangas" e que gostei de encontrar.
Beijinhos

3:33 pm  
Blogger LUIS MILHANO (Lumife) said...

É sempre bom lembrar casos como este sejam ficção ou reais para que certos espíritos se abram para a realidade que nos cerca.


Desejo tudo de bom em 2008.

Abraços

3:40 pm  
Anonymous Anonymous said...

hummmmmmmmmmmmmmm... este hum quer dizer = lindo mesmo! belo no descrever, belo nas situações criadas na narrativa de que eu já falei noutros capítulos... a simplicidade do contar mete o leitor dentro das atmosferas criadas e isso é, para mim, a melhor forma de o prender...
e agora parabéns pela temática abordada neste capítulo e com um saber «de experiência feito»... a deficiência assim posta toma contornos de uma realidade que muitas vezes procuramos esconder, por serem diferentes? não sei... mas mais uma vez os meus parabéns, porque Cátia é um ser humano com direito à vida e ao amor e o texto é delícia mesmo por esse respeitar da integridade da pessoa, seja ela como for...
esta parte tocou-me mesmo...
os meus sorrisos @@@

6:56 pm  
Anonymous Anonymous said...

Parte 118 - Uma lição de vida

10:27 pm  
Anonymous Anonymous said...

Sabem que já reli 3 vezes este texto?

Dizer que está bem escrito quase é banalidade, sois excelentes escritores e todos nós sabemos... e é excelente ler-vos!!!

Mas o tema é deveras muito importante... Claro que toda a gente, com todas as suas deficiências, têm todo o direito a serem felizes nas suas insuficiências, físicas e mentais, no dia a dia... nas amizades, nos namoros, e no amor, claro está!

Este capítulo tocou-me bastante... a maldita mania de se ver de soslaio pessoas ditas como não normais é destestável, é discriminação pura e aberrante... são pessoas vivas que querem ser felizes, e ponto final!!!

Embora o conto seja ficcional, que seja lido e entendido por muita gente... todas as pessoas sejam como forem têm direito a ser felizes!!!... E Cátia neste conto/romance tem pela frente dias felizes... congratulo-me, em sorrisos nos olhos, que tenham escrito isto... meus mais sinceros parabéns!!!

Adoro lê-los sabiam???

Beijinhos e abraços!!!

7:49 am  
Anonymous Anonymous said...

um conto virtual, mas com mais uma experiência de vida que existe, só que nem sempre é conhecida da sociedade, primeiro porque nem sempre dão possibilidades a que pessoas que não estão dentro do grupo dito NORMAL, e depois porque a sociedade ainda olha estes seres que tão ricos são de sentimentos, como "coitadinhos".
Continuem com as vossas historias de vida.
beijos

11:58 pm  
Anonymous Anonymous said...

São histórias reais, infelizmente mais frequentes do que imaginamos. É precido dar-lhes todo o nosso apoio e ajuda.

11:42 am  
Blogger Papoila said...

Meus Querido!
Imaginam como me tocou este episódio!
Já o li mais que uma vez.
Vocês tratam um assunto melindroso a descriminição ilegal dos que sofrem algum tipo de incapacidade. A Cátia é uma pessoa que ama a vida e tem direito à felicidade e realização pessoal.
Muitos Beijos

10:37 am  
Blogger Unknown said...

Isa, minha amiga! Tu sabes que eu gosto muito de ti e da tua poesia.

É, podes crer uma sentida homenagem.

As tua visitas, são como que alguém me ofereça um raminho, ou uma simples flor, com muito amor.

Sê feliz.

Bjnhs

ZezinhoMota

10:54 am  
Blogger maresia_mar said...

Olá meus queridos amigos,
mesmo que esta seja uma obra de ficção é muito bom focarem temas destes.. lindo como sempre mais este capitulo.. Bjhs e bom fds

11:54 am  
Blogger lena said...

Isa e Luis meninos lindos

também já o tinha lido, faltava dizer que gostei e que estive atenta à abordagem neste capítulo

gostei de saber de Cátia, há muito que não tinha novidades dela. ainda bem que encontrou o caminho da felicidade, pois ela mora ao nosso lado, é uma busca constante

abordaram muito bem a doença da Cátia, que é só diferente mas igual, nada a impede de ser feliz, ter a sua vida e ser tão especial como pessoa, sempre pronta a ajudar, com força e vontade de viver como o Eduardo refere

gostei deste capítulo, um esclarecimento necessário para quem se diz normal. no fundo todos somos normais, é urgente acabar com os preconceitos. com os lamentos...

deixo-vos um beijo e o meu abraço forte pela percistencia e por nos darem sempre algo de novo

lena

8:35 pm  
Blogger Å®t Øf £övë said...

A internet de facto faz verdadeiros milagres, e aproxima pessoas que sem este meio nunca se cruzariam. Este é mais um dos muitos casos que há assim.
Beijos e abraços.

10:36 pm  

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