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Saturday, March 11, 2006

Virtual Realidade Parte 06

Correu para o monitor. Com um pouco de sorte ainda o apanhava: sabia que normalmente ele se levantava cedo e ia ao computador antes de sair para o emprego.
Viu o nick dele entre muitos outros que já se encontravam àquela hora da manhã on-line. O coração começou a bater fortemente.
─ Bom dia!
─ Olá Princesa! Que boa surpresa! Caíste da cama?
─ Não! Estava com saudades tuas! Queria desejar-te um bom dia, antes de saíres.
─ Obrigado! Um bom dia para ti também. Já estou aqui desde as 6 horas a pesquisar umas coisas e a ver o correio, mas agora estou de saída. Desculpa não te poder dar mais atenção. Falaremos logo por volta das 22h. Tem um bom dia. Até logo!
─ De nada. Até logo e vai com cuidado. Um beijo!
─ Outro. Au revoir! ─ E desligou.
Luísa sentia o Eduardo distante e por vezes com mudanças de humor repentinas. Mas não queria pensar muito no assunto, pois nem sempre as pessoas podem estar bem.
Luísa ficou no IRC mais um pouco e começaram aparecer diversos nicks.
“É desta vez que vou encontrar uma amiga?” Pensou
─ Olá!
─ Oi! Tudo bem com você? Está falando de onde?
─ De Portugal!
─ Tenho muita vontade de conhecer seu país. Quem sabe um dia eu não lhe irei fazer uma visitinha. Como se chama? Eu sou Fernanda!
─ Meu nome é Luísa! Eu também não conheço o Brasil. Minha mãe nasceu em Pernambuco.
─ Tem que vir cá viu, mocinha!
Despediram-se prometendo não perder o contacto. Luísa já estava mais animada.
Entretanto tinha vários nicks a cintilar no cimo da janela do mirc e resolveu ir ver o que aquilo daria, clicando num de cada vez e lendo o que aparecia escrito, a ver se valeria a pena responder a algum deles.
─ Oi! Tás boa? Nome, idade ddtc?
Outro:
─ Olá! Queres fazer amor comigo?
Outro ainda:
─ Precisa-se menina para ménage à trois; queres alinhar?
“Vulgares e atrevidos”, pensou Luísa, “isto é mesmo só idiotas frustrados sem um pingo de sensibilidade. Desisto” e desligou-se do IRC. “O Eduardo não tem nada a ver com este mundo”.
Depois do almoço, foi ao orfanato que visitava regularmente. Era voluntária. Havia sempre muito trabalho para fazer. Desde dar os biberões aos bebés a fazer docinhos e outras coisas.
A superiora foi ter com a Luísa à cozinha, enquanto ela misturava a farinha com o açúcar, a margarina e os ovos.
─ Boa tarde Luísa! Como sempre dedicada a presentear as crianças com gulodices; veja lá não as estrague com tantos mimos.
Luísa sorriu para a superiora e disse:
─ Gosto de ser útil. Dá-me uma certa paz! “ As crianças são a melhor coisa que existe no mundo”, dizia o Fernando Pessoa e tinha razão.
Ainda saiu cedo do orfanato. O sol ainda ia alto e resolveu passar pela praia antes de entrar em casa. Adorava assistir ao pôr-do-sol.
Tal como imaginara a praia estava deserta. Luísa sentou-se na areia, olhando o mar; os seus pensamentos voaram até Eduardo, relembrando uma das últimas conversas. Como foi bom tê-lo encontrado; ele deu-lhe uma certa confiança, não lhe fez perguntas, deixou-a simplesmente falar, abrir o seu coração. Mentalmente falou com ele e disse-lhe: “Contigo tenho partilhado os sonhos e desaires da minha vida, tenho contado histórias e segredos. È tão bom ter-te sempre por perto ainda que longe”.
Luísa, desde o divórcio, levava uma vida recatada. Tinha colocado em primeiro lugar, o amor que tinha pela filha esquecendo-se de si própria. Muitas vezes sentia falta de um ombro amigo, de um carinho até mesmo de sexo. Nestes últimos anos tinha tido poucas aventuras e, quando começavam a ficar mais sérias ela simplesmente cortava. Os anos passavam e a solidão começava a pesar, quando se lhe proporcionou entrar no mundo dos chats on-line. Tinha necessidade de encontrar alguém que a compreendesse, algum amigo que a ouvisse, ainda que virtual. A própria filha lhe dizia que ela precisava de arranjar um namorado. Entrou no mundo mágico da virtualidade. As amigas já lhe vinham falando nisso havia algum tempo. Tinha-se decidido finalmente e, passados poucos dias, encontrou o Eduardo no IRC. Depois de algumas conversas já não conseguia passar sem ele. Repentinamente, levantou-se e foi direita a casa. Tinha que contar ao Eduardo uma coisa importante.

Continua...