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Thursday, October 04, 2007

Virtual Realidade Parte 105


Ao saírem, foram surpreendidos por uma chuva miúda que tornava difusa a luz dos candeeiros da rua. Tudo em redor, onde os raios luminosos pousavam, tinha o brilho da água que caía do céu.
Quando deixaram o restaurante já algumas nuvens cinzentas avançavam de sudoeste, mas não faziam ainda adivinhar que a noite seria assim chuvosa, uma vez que o dia havia começado com muito sol.
─ Que coisa! Com esta é que eu não contava! ─ exclamou Sara, visivelmente desagradada. ─ Detesto viajar com chuva.
─ Nada a fazer, minha cara! Espera um pouco que tenho um guarda-chuva no carro. ─ aconselhou Eduardo. ─ Ando sempre prevenido.
─ Não queres ficar cá mais esta noite? Com este tempo seria melhor ires de dia. ─ sugeriu Teresa.
─ Não. Tenho mesmo de ir. ─ mentiu a escritora ─ Obrigada na mesma!
Chovia continuamente, agora em gotas maiores, parecendo que do céu caíam lágrimas de tristeza sobre o aquário da vida.
Eduardo levou-a até ao automóvel, abrigando-a da chuva.
─ Até breve! ─ disse para Pedro que ainda estava à porta com a filha a vê-los partir.

Eduardo parou em frente à porta principal da gare. Sara, saiu rapidamente do carro, fustigada pelo vento e pela chuva, e entrou apressadamente, voltando pouco depois.
Eduardo, que ainda não tinha estacionado, olhou para ela surpreendido, não conseguindo conter o riso.
─ Pareces um pintainho ─ disse, abrindo-lhe a porta do carro ─ Perdeste o comboio?
─ Sim, partiu há cinco minutos e o próximo é só daqui a duas horas. Vou chegar tardíssimo, molhada e cansada. Começa tudo a correr mal. ─ respondeu, olhando alegremente, como se a situação a divertisse, para as roupas encharcadas.
─ E agora o que pensas fazer?
─ Acho melhor levares-me a um hotel. Passo cá a noite e sigo amanhã de manhã. Tenho comboio às 9 horas.
─ Um hotel?! Podias ter ficado em casa da Inês.
─ Pois! Mas disse à Teresa que precisava mesmo de ir embora e agora não vou voltar atrás. Quem me dera ter por aqui perto uma pessoa amiga que me oferecesse guarida por esta noite!
As palavras dela eram uma sugestão a que ele a convidasse a pernoitar na sua casa, mas ele simulou não ter percebido.
─ Seria uma sorte dos diabos! E é nestas ocasiões que verdadeiramente se conhecem os amigos! Mas tinhas mesmo de ir embora?
­­­─ Não forçosamente, mas…não quero causar embaraços lá em casa.
─ Eu entendo. Bom, só conheço um hotel que a esta hora ainda tenha de certeza um quarto livre. Se é isso que queres... com banho quente, hidromassagem e tudo…e não te sairá nada caro.
─ Então leva-me lá já. Preciso de mudar de roupa rapidamente. Começo a sentir frio e não quero adoecer.
─ Pois precisas. Vamos embora então. Também não quero que adoeças.
Ao aproximar-se de casa, Eduardo accionou o portão automático para meter a viatura na garagem. Era uma vivenda de arquitectura moderna, de rés-do-chão e primeiro andar, toda de cor branca, com telhado negro; as janelas e as portas eram de alumínio castanho-escuro e um gradeamento da mesma cor, em volta da varanda, abrangia dois dos alçados. Na frente para a rua havia um relvado bem tratado, rodeado de roseiras e interrompido pelo acesso à garagem. Eduardo parou o automóvel esperando que o portão se abrisse completamente e Sara perguntou:
─ É aqui? Parece bem pequeno para hotel.
─ Mas é acolhedor. Não te preocupes que o pessoal faz questão de fazer com que os hóspedes se sintam como em suas casas.
Eduardo ria ao ver que Sara ainda não tinha percebido que ele a levara para casa.
─ Espero bem que sim, mas ah, ah, ah! Tu estás a enganar-me. Isto é mas é a tua casa. Até metes o carro na garagem e tudo! Meu malandro!
─ Ah, ah, ah!
─ Mas que burrinha eu fui agora! ─ e ria muito também. ─ Será que o pessoal é mesmo como tu disseste? ─ perguntou, entrando na brincadeira.
─ Respondo por eles todos. Alguma reclamação, vens ter comigo.
─ A qualquer hora?
─ A qualquer hora.
─ És um amor em cuidares assim de mim. Afinal parece que tenho mesmo um amigo por estas bandas e não sabia. Peço desculpa de há pouco ter dito aquilo. Mereci a lição.
─ Pois, não foi nada bonito, teres posto em causa a minha amizade. ─ respondeu Eduardo, mostrando-se amuado.
­­­­─ A sério, desculpa! Mas como me vias neste estado e não oferecias …
─ Estou a brincar contigo.
─ És mau! Bom, agora preciso de tratar de mim.
Ele indicou-lhe onde ficava o quarto de hóspedes com casa de banho própria.
─ Fica à tua vontade. As toalhas estão lavadas, podes usá-las.
Deixou-lhe a mala em cima da cadeira e, fechando a porta atrás de si, saiu do aposento.

Sara, depois de ficar só, entrou na casa de banho tiritando de frio. Olhou para a banheira com hidromassagem e não resistiu: encheu-a, tirou os sais de banho da mala e polvilhou a água até ter imensa espuma. Entrou nela, ligou o sistema de hidromassagem e fechou os olhos deliciando-se com a temperatura da água, que ia penetrando no seu corpo gélido, e com os jactos de espuma que lhe acariciavam a pele sedosa. “ O paraíso deve ser isto!” ─ pensou, deixando-se divagar com um sorriso nos lábios e esquecendo-se do tempo.

Eduardo foi para a sala acender a lareira ─ a casa estava fria ─ e os seus pensamentos começaram a incomodá-lo: ”O que achariam a Teresa e o Pedro se soubessem que a Sara vai passar a noite cá em casa? Certamente ficariam a pensar que tínhamos combinado antes e não lhes quisemos dizer nada; e que foi por isso que a ela mentiu quando disse à Teresa que tinha de regressar a casa. A verdade é que não o planeámos e isto aconteceu por mero acaso. Não tenho nada a esconder, mas desta vez é melhor não saberem. Se fosse um homem, pareceria muito natural ficar cá; mas sendo uma mulher torna-se logo altamente suspeito. Como se um homem e uma mulher não pudessem coabitar sem «terem» de acabar os dois juntos numa cama. Do ponto de vista da normalidade consensualmente estabelecida, se, quem me conhece e sabe que vivo sozinho há muitos anos, descobrisse que eu tinha uma mulher a dormir na minha casa, isso seria o bastante para ficar provado nas suas mentes que dormíamos juntos, o que seria o mesmo que dizer que eu tinha sexo com ela. Talvez as pessoas tenham razão. Talvez não haja nenhum homem que, em presença duma mulher bonita, nestas condições, fosse capaz de resistir. A educação, proibindo as manifestações naturais da sexualidade desde a mais tenra infância, tem aqui um dos seus muitos efeitos perversos. Outros são a violação e a pedofilia. E todos, ou quase todos, fomos submetidos a esse tipo de educação, já que parece não haver outro em todo o mundo civilizado. É certo que alguns, muito poucos, de nós, por uma sorte enorme, ou do mesmo modo que alguns corpos em meio contaminado de bactérias patogénicas, por características especiais da sua natureza, conseguem sobreviver imunes, escaparam às influências perniciosas dessa educação.”

Naquele momento ouviu um estrondo, e correu apressadamente para o quarto onde estava a Sara. Bateu à porta da casa de banho e, de lá de dentro, ninguém respondia. Voltou a bater com mais força, gritando:
­─ Sara, estás bem?
A escritora acordou dos seus devaneios e respondeu:
─ Sim, estou bem! Deixei-me adormecer.
─ Ouvi um barulho e pensei que tivesse sido aí.
─ Deve ter sido lá fora., mas podes entrar para verificar.
─ Se estás bem não quero perturbar o teu banho.
─ Não perturbas nada. Aliás, só me verás do pescoço para cima porque estou vestida de espuma. Pensavas que te autorizaria a entrar se estivesse nua?
─ Claro que não, mas não sendo necessário que iria eu aí fazer?
─ Por exemplo, chegares-me a toalha que deixei pendurada na porta. Assim evitaria molhar-te o chão. Fazes-me esse favor?
─ Se é assim, porque não?

Continua...

19 Comments:

Blogger tb said...

Uma abrodagem interessante sobre as relações entre homens e mulheres e o que nos incutem de crianças como dados adquiridos. Sempre quero ver acontecer aqui o que sempre desejei ver numa história...
Como sempre, bem escrito com boa imaginação, detalhes e cuidado. Desta vez surpresa antecipada. :)
Beijinhos

9:14 pm  
Blogger Miguel Augusto said...

É natural que um homem e uma mulher não se envolvam obrigatoriamente quando partilham uma casa, agora que com o passar do tempo isso é cada vez mais provável acontecer, é!
Beijinhos e venham mais capítulos

10:15 pm  
Anonymous Anonymous said...

Parte 105 - A mentira de Sara

Confesso que me assusta a espera do próximo capítulo. Preferia não sentir esta angústia em relação à Luísa porque se ela souber... Vou esperar para ler. Mas juro que estou angustiada. Serei normal?

Abraços

1:49 am  
Anonymous Anonymous said...

A escrita � de uma leveza e simplicade que a torna completamente veros�mil, entranhamo-nos nas personagens com uma naturalidade aut�ntica, porque elas est�o bem desenhadas. Os di�logos huuuuuuuuuuuuuuuu s�o a mesma coisa, di�logos de uma hist�ria bem contada, mesmo quando n�o lida para tr�s... metemo-nos nas personagens e nas suas viv�ncias porque s�o como n�s. Depois h� pequenas reflex�es com imagens lindas que d�o um grau de poeticidade ao texto, que at� � narrativo.

�Tudo em redor, onde os raios luminosos pousavam, tinha o brilho da �gua que ca�a do c�u.�

�Chovia continuamente, agora em gotas maiores, parecendo que do c�u ca�am l�grimas de tristeza sobre o aqu�rio da vida.�

esta �gua, este aqu�rio de vida � um espanto... met�foras de beleza...e a utiliza�o do discurso indirecto livre para exprimir pensamentos de uma personagem quase nos obriga a estar dentro dele...

parab�ns num sorriso @@@ aeriene

11:15 am  
Blogger Nilson Barcelli said...

O romance estava a precisar de um acontecimento como este...
Veio na hora, mas não faço ideia se a Sara se vai levantar a horas para apanhar o comboio...
Bfs, beijinhos e abraços.

11:49 am  
Anonymous Anonymous said...

Aqui vos deixo um beijo...Bom fim de semana

7:34 pm  
Blogger Papoila said...

Olá meus amigos:
Depois deste capítulo fico em suspense para ver o que vai acontecer.
Beijos

1:02 am  
Anonymous Anonymous said...

Que chatice.. Sara sem querer perdeu comboio... e muito contrariada foi parar a casa de Edu.

Claro que uma mulher pode passar a noite em casa de amigo... mas... mas palpita-me que isto, esta noite, vai ser passada em claro... bom, quando não se pode evitar o inevitável, que se há-de fazer!?

Vou esperar para ver no que isto vai dar :)

Bom capítulo!!!

Beijinho e abraço...

7:32 am  
Blogger Isa e Luis said...

Removemos o comentário de lapa por não conseguirmos ler os hieroglifos apresentados. Pedimos o favor de, para a próxima, usares de clareza.

Um abraço
Luís

5:21 pm  
Anonymous Anonymous said...

Bem, já não estou a gostar nada da ideia da Sara ficar em casa do Eduardo, até porque a sara está cheia de vontade de cair nos braços do Eduardo, espero que o Eduardo não se deixe levar, "A natureza puxa e a carne é fraca" a ver vamos, fico ansiosa pelo próximo capitulo, beijinhos

8:49 pm  
Blogger Fragmentos Betty Martins said...

Olá Isa e Luis

Aqui ando eu a ler os capítulos atrasados:)) vai levar um pouco de tempo_______mas vou conseguir

Já vi que a vossa grande forma na "escrita" se mantém

Parabéns!

Beijinhos com carinho

7:24 pm  
Blogger Maré Viva said...

Palpita-me que a Sara traçou um plano e vai conseguir levá-lo até ao fim...
Beijinhos para os dois!

10:27 pm  
Anonymous Anonymous said...

Vamos ver como termina o banho de Sara....chuva, lareira...nada melhor para uma noite de amor.

jinhos e boa semana

10:54 pm  
Anonymous Anonymous said...

Acho que esta Sara tem tudo planeado, não estou a gostar, esqueceram-se da Luisa?;)
Boa semana
Beijokas 1000

9:28 am  
Blogger margusta said...

Venho deixar um beijinho amigo e o meu :)))

12:00 am  
Blogger lena said...

amigos queridos, Isa e Luís

hoje quase me entusiasmaram com um ar de romance no ar entre os meus protagonistas preferidos, claro que a Sara e o Eduardo. mas era sorte a mais e como a vida não é feita de sortes o Eduardo não deixa a Luísa, mesmo com a juventude, a beleza e encanto que a Sara deixa transparecer

sendo assim fico a aguarda a entrada do quarto de banho para a entrega da toalha e um fingir que nada foi visto, pois como o Eduardo bem diz : “Como se um homem e uma mulher não pudessem coabitar sem «terem» de acabar os dois juntos numa cama.” pois nisso tenho que concordar com ele. a amizade permite que isso aconteça e como bons amigos passarem uma ou mais dias juntos. é natural ser assim. mas certas as cabeças muitas vezes “vêm” o que não existe

uma vez mais viajei no banco de traseiro, mas só para ver como os “meus meninos” se portavam

adoro o que nos oferecem e cada vez fico mais preza a este vosso romance

o meu abraço para além do virtual

beijinhos muitos para os dois

lena

5:04 pm  
Blogger Å®t Øf £övë said...

Claramente estamos aqui a assistir a um subtil jogo de sedução por parte de ambos. É verdade que são as circunstância que o estão a proporcionar, mas como se costuma dizer, a ocasião faz o ladrão, e uma noite de sexo bem passada nunca fez mal a ninguém, nem dai veio mal ao mundo.
Beijinhos e abraços.

11:00 pm  
Blogger Catarina said...

Ola

Para lhes agradecer por partilharem connosco esta interessante historia deixo-lhes um prémio la na minha ville de lumiere.
Passem por la:)

Bjtos

11:17 am  
Blogger Jorge Bicho said...

Beijos, e a vontade que me traz sempre aqui, renova-se na vossa longa história que tem sempre um cheiro fresco e novo.
brilhantes amigos
um beijo no coração
JB

10:00 am  

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