Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, November 10, 2006

Virtual Realidade Parte 60


Luísa antes de entrar em casa ficou no jardim, sentada no baloiço, por aquele resto de tarde em que os últimos raios de sol já se despediam no horizonte, a saborear o momento acabado de viver, sentindo ainda o fresco hálito de Eduardo na sua boca.
Olhando à sua volta deu conta que as flores de um canteiro estavam tristes, «pedindo a deus a bênção de uma fonte»; deu-lhes água e falou-lhes do seu amor, um amor que esteve murcho também, mas que despertou regado pelo amor de Eduardo. E elas ficaram felizes com a água que Luísa lhes deu.
Sentou-se de novo no baloiço e a certa altura os seus olhos poisaram num grupo de quatro formigas no trabalho, para elas hercúleo, de arrastar uma batata frita. “As formigas também gostam de batatas fritas”, pensou a sorrir. E pôs-se a admirar o extraordinário esforço que elas faziam, ora agarrando num dos lados da batata, ora no outro, arrastando-a sempre lentamente, afastando-a da casa em direcção ao muro do jardim que dava para o pinhal.
“Dali não passarão com certeza”. Eram formigas grandes, mas mesmo assim…
Mal se tinham aproximado da base do muro quando viu que mais formigas apareceram sem saber de onde, e todas juntas se propuseram levar de vencida aquele obstáculo extraordinário que lhes dificultava a tarefa mas não a impedia.
Luísa sempre com olhar atento e sem querer acreditar no que via, acompanhou aquela escalada impossível, mas bem sucedida ao fim de vários minutos, quando o sol já estava meio escondido no horizonte e as luzes na rua já se acendiam
─ Extraordinário! ─ Exclamou. ─ Que lição de união, de trabalho, de sabedoria! Todas juntas por uma causa: o bem-estar da colónia a que pertencem. Se os humanos fossem assim…
Mas naquele fim de dia, sublime e único, tudo lhe parecia belo e nem mesmo a irracionalidade dos homens a faria mudar aquilo que sentia. Os deuses pareciam ter predestinado aquele encontro entre ela e Eduardo.
Entrou em casa feliz, caminhando sobre as nuvens construídas com a certeza da felicidade acabada de entrar na sua vida. Sentia a natureza a pulsar no seu coração e foi direita à cozinha que esperava por ela; também ela, por minutos, teria que fazer como a formiga, limpar tudo, deixar a cozinha a brilhar. Enquanto lida pensa que dentro de duas horas Eduardo já estará em casa. Só de pensar que vai ouvir de novo aquela voz doce, clara e firme que tanto amava, sente a pele arrepiar-se.
Não queria falar com ninguém, mas apenas ficar em casa a relaxar, à espera do telefonema do Eduardo: não desejava que o encanto se quebrasse naquele dia tão especial para ela. Depois de tomar banho passou pela casa de jantar e levou a jarra das flores consigo para o quarto. Desejava o seu espaço perfumado com aquelas lindas rosas. Olhou ao seu redor e nunca a cama lhe tinha parecido tão vazia como naquele momento. Desejou ardentemente ter o Eduardo muito em breve ao seu lado. Deitou-se em cima da cama, e começou a divagar. Na sua mente foram-se formando pequenas frases que logo colocou no papel para lhes dar vida sob a forma de um poema.
Passado meia hora sorriu satisfeita. Agora seria só esperar que o Eduardo ligasse. O tempo passava e ele nunca mais dava sinal. Luísa começava a ficar preocupada e aconselhava calma a si própria, que ele a qualquer momento ligaria. O tempo avançava e Luísa cada vez mais ansiosa deu um salto na cama quando o telefone tocou, finalmente.
─ A minha Princesa já dorme?
─ Ainda não mas já estou deitada. Não conseguiria adormecer sem noticias tuas.
─ Pois aqui as tens, amor! Fiz uma óptima viagem, já tomei banho, jantei e agora, já na cama prontinho para nanar, vim aqui dizer-te que cheguei bem e namorar um pouco contigo.
─ Maroto! Eu estava preocupada, até pensei que algo de mau te pudesse ter acontecido. Felizmente chegaste bem. Já posso respirar.
─ Sempre exagerada!
─ Por ti sempre! Amor, escrevi uma coisa para ti, queres ouvir?
─ Sou todo ouvidos!
E Luísa com a sua voz rouca e sensual recitava o poema que tinha escrito.

Dádiva!

O sol brilha acima das densas nuvens,
Rompendo a cinzenta brisa inebriante.
Nos galhos, os pássaros cantam alegres
Em sintonia com as flores a desabrochar.
Num dia de incomparável júbilo,
Como lufada de ar fresco, o teu degelo
Enriqueceu a minha ânsia de viver,
Que se transforma numa dádiva ofertada
Pela mão do destino que nos une.
O nosso entusiasmo contagiante,
Faz-nos irradiar os sentimentos
Como um vulcão em erupção
Nos nossos corações mal amados.

─ Lindo, adorei! Obrigada amor. Só que os nossos corações deixaram de ser mal amados. A partir de hoje vamos cuidar muito bem deles.
─ Vamos sim, amor, tu cuidas do meu e deixas-me cuidar do teu, xim?
─ Xim, doçura, por todo o resto das nossas vidas. Onde estiveste tu este tempo todo sem que eu te tivesse encontrado?
─ Há muito tempo que te encontrei e vivia perto de ti, mas tu demoraste a ver-me. Quanto tempo perdido!...
─ Tens razão. Como posso ter sido tão cego?!
─ Foram os teus receios que te impediram de me ver.
─ A confiança é uma arma de dois gumes: tanto pode cortar para um lado como para o outro.
─ Pois, no meu caso e no que te diz respeito cortou para o lado certo. Desde o inicio do nosso conhecimento senti que tudo me puxava para ti e ficava triste porque tu te afastavas sempre de mim e muitas vezes para bem longe.
─ Mas podias ter-te enganado!
─ Acho que não podia. Pelo modo como me falavas e pelo que dizias era difícil que fosses diferente do que eu imaginei.
─ Quer dizer que ainda não descobriste nada que me fosse desfavorável. ─ Disse Eduardo a rir.
─ Descobri sim, mas não te digo! ─ Exclamou Luísa a rir também ─ Primeiro quero prender-te na teia dos meus beijos e só depois te contarei tudo.
─ Pestinha! Traidora! Isso não se faz!
─ Ai faz, faz! E farei muito pior do que isso! Vais ver quando cá vieres de novo!...
─ Conta o que pensas fazer-me quando eu voltar a estar contigo…
─ Vem e verás!
─ No areal outra vez? ─ Perguntou percebendo a intenção de Luísa.
─ Não, surpresa!
─ Ui! Já tremo de pavor!
E mudando de tom Luísa disse:
─ Sabes amor, esta noite sonharei contigo e reviverei aquele momento lindo na praia. Quando poderás voltar cá?
─ Acho que poderemos passar juntos o próximo fim-de-semana. Depois ligo-te a confirmar.
─ Que bom! ─ Exclamou Luísa sonhadora.
─ Sim, vai ser. E agora vamos nanar?
─ Vamos sim.
─ Vou embalar o teu sono com uma canção. Queres?
─ Xim, quelo!
─ Então fecha os olhos, escuta e relaxa:
Eduardo canta para Luísa adormecer:
─ Dorme, dorme meu amor lindo, que serei teu anjo da guarda. Dorme descansada que afastarei o papão. ─ E melodiosamente continuava sem parar.
Embalada pelas suaves palavras e cansada das emoções do longo dia, Luísa adormeceu e deixou cair devagarinho o telemóvel. Eduardo sorriu e desligou o seu enfiando-se debaixo das mantas, também ele, iria certamente sonhar com a sua amada.

Continua...