Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, December 08, 2006

Virtual Realidade Parte 64


Um jantar de bacalhau espiritual, regado com um bom vinho branco que Eduardo tinha feito questão de levar, foi servido . Apesar da animação em que decorreu, era perceptível alguma ansiedade. No fim da refeição a sala de estar recebeu-os nos seus sofás, de braços abertos, onde tomaram o café servido pela Teresa, numa espera tacitamente silenciosa, mas expectante, até que Eduardo começou a falar:
─ Antes de mais nada, permitam-me que vá com a Inês ao computador ver uma coisa.
─ Estás à vontade. ─ Exclamou Pedro.
─ Inês, ligas o computador, por favor? ─ Pediu Eduardo.
Inês levantou-se e foi ligar o PC. O tio Edu correu o mirc e verificou que estava configurado para gravar os logs dos diálogos privados. Procurou a pasta onde o mirc, por defeito, os costumava guardar e confirmou que estavam lá todos.
─ Por sorte está cá tudo. Isso facilita-nos a vida.
─ Podes dizer-nos o que está a acontecer? ─ Perguntou Pedro ansioso e sem perceber o que se passava.
─ Calma que já vais ficar a saber tudo. Inês, posso copiar?
─ Podes sim.
─ Desculpa, empresta-me uma disquete se fazes favor!
Depois de copiar tudo o que precisava, Eduardo voltou a sentar-se no sofá, e começou a falar aos amigos:
─ Em primeiro lugar ninguém está aqui a ser acusado de nada e a Inês não merece ser recriminada. Ela apenas está a ser vítima de um tipo sem escrúpulos e da sua própria inexperiência.
─ Nós não a acusamos de nada. ─ Respondeu Teresa.
─ O que aconteceu? Algum problema com a minha mana? ─ Quis saber André, curioso e admirado, sem entender nada do que ouvia.
─ Sim, ─ respondeu Eduardo ─ mas não foi por culpa dela. Presta atenção porque um dia pode acontecer-te o mesmo e é bom que vás aprendendo.
André ficou calado e muito atento enquanto o tio Edu expunha o assunto e lhes dava a conhecer o plano da Sara para tentar apanhar o sujeito e a razão de ter ido ao computador recolher os logs relacionados com o caso. E, dirigindo-se ao André:
─ Percebeste o que aconteceu?
─ Acho que sim.
─ Então não te esqueças daquilo que ouviste aqui, para que te sirva de exemplo e aprenderes a ter cuidado quando falares com pessoas na Internet. E não contes nada disto a ninguém, nem aos teus melhores amigos. Se o fizeres poderás estragar o plano todo. Prometes que não contas?
─ Prometo, tio Edu! Por mim ninguém saberá nada. E para ajudar a minha maninha farei qualquer coisa.
Pedro e Teresa olharam-se comovidos pela resposta do filho e a Inês correu a dar um beijo ao irmão. O casal sentiu naquele momento que teriam de mudar de atitude, estarem mais atentos aos filhos. Eles precisavam de toda a sua atenção e orientação para caminharem na estrada da vida.
─ É assim mesmo! Obrigado André! Eu sabia que podíamos confiar em ti. És um homem responsável.
André sorriu satisfeito por se sentir parte importante daquela trama e poder ajudar a irmã no papel que lhe era atribuído. Como todas as crianças, gostava que confiassem nele, o tratassem de igual, tão capaz como um adulto de estar à altura de qualquer responsabilidade.
─ Inês, também vais ter de estabelecer um acordo comigo…─ Continuou Eduardo.
─ Um acordo?!
─ Sim, um acordo para cumprir. A partir do momento em que eu fizer chegar às mãos da minha amiga o conteúdo desta disquete tu deixas definitivamente de falar com o tal nick. Se o fizeres poderás deitar tudo a perder, entendes? A Sara vai tomar o teu lugar nas conversas e se ele descobre que andam duas pessoas na jogada fica desconfiado e desaparece sem deixar rasto.
─ Sim, tio Edu confia em mim. Eu até já nem falo com ele desde aquela vez.
─ Ok. Pode-se dizer que a partir deste momento estás livre e tem cuidado para não caíres nas conversas de outro igual.
─ E nós não fazemos nada? ─ Inquiriu Pedro
─ Apenas não falem com ninguém sobre o acontecido. Fica tudo entre nós, pelo menos até apanharmos o sujeito.
─ E achas que a Sara é de confiança? ─ Perguntou Teresa.
─ Sim, acho. E é esperta. Além disso não tinha outra alternativa. Estou certo de que se vai sair bem e eu vou ajudá-la no que for preciso.
─ Agora que estamos todos esclarecidos parece que podemos confiar que isto vai acabar bem. Obrigada por tudo Eduardo! Nem sei como te agradecer. ─ Disse Teresa.
─ Em principio sim. Se queres agradecer-me é muito fácil: basta que me convides para mais um daqueles teus fabulosos almoços ou jantares como este. ─ Respondeu Eduardo a rir.
─ Não seja por isso, mas acho bem pouco para o amigo que tu és e pelo que estás a fazer por nós.
─ Então convidas-me para dois…
Quando a gargalhada geral acabou Pedro chamou a atenção dos miúdos:
─ Meninos, está na hora de ir para a caminha!
─ Só mais um minuto papá! ─ Pediu Inês. E aproximando-se do tio Edu segredou-lhe ao ouvido:
─ Não vais contar sobre a tua namorada?
─ Claro que vou! ─ Respondeu Eduardo de modo a que todos ouvissem.
Achando aquela resposta muito estranha por não conhecerem a pergunta que a tinha originado, Pedro e Teresa fixaram no tio Edu um olhar interrogativo.
Inês virou-se para os pais e anunciou:
─ O tio Edu tem uma coisa importante para vos contar. Eu e o André também queremos ouvir e depois vamos dormir.
─ Pelos vistos tu foste a primeira a saber! ─ Sorriu Teresa.
─ E tinha de ser porque sou a pessoa que gosta mais dele. ─ Brincou a Inês.
─ Quem gosta mais sou eu! ─ Retrucou o André.
─ Bom Eduardo, agora tem aqui uma competição entre os dois para saber quem gosta mais de ti. ─ Exclamou Pedro a rir apontando os filhos. ─ Vamos ter de ir buscar uma balança. ─ E dirigindo-se aos filhos: ─ Então, deixem o tio Edu falar!
Eduardo falou sobre o seu relacionamento com Luísa. Quando acabou o casal abraçou-o, ambos felizes, porque havia muito tempo que achavam que Eduardo devia repartir a sua vida com uma mulher que o amasse como ele merecia.
─ Parabéns amigo! Pareceu-me notar no teu rosto uma aura de felicidade, mas nem por sombras podia imaginar uma coisa dessas. Vamos brindar!
Depois do brinde à felicidade de todos as crianças fizeram as despedidas e foram-se deitar.
Eduardo queria ainda falar sobre a magreza da Inês, mas estava-lhe a custar a ideia de levantar um problema de cuja existência não estava seguro, e foi Teresa quem abordou a questão:
─ Não achas a minha filha muito magra?
─ Sim tenho notado que emagreceu bastante nos últimos tempos. Acho-a magra demais para a altura que tem e notei que comeu muito pouco à refeição. Ela anda assim a comer mal há muito tempo?
─ Sim Eduardo, temos andado preocupados com isso também. E não adianta insistir com ela para comer. ─ Informou Teresa.
─ Disse-me que apenas mudou de hábitos alimentares, mas eu vejo bem que come muito menos do que comia antes, o que nesta idade me parece de estranhar.
─ Esperamos que não seja um desses problemas de anorexia que parecem estar tanto na moda.
─ Tenham calma! Pode ser que com uma conversa bem esclarecedora ela reconsidere.
─ Não terá tudo a ver com este caso? ─ Perguntou Pedro.
─ As duas situações coincidiram no tempo?
─ Sim, mais ou menos.
─ Pode ser, mas é capaz de haver por aí outras influências também. ─ Alertou Eduardo.
─ Estejam atentos discretamente, mas não lhe façam admoestações, nem a convençam a comer coercivamente, em caso algum. Tenho uma amiga nutricionista que deviam consultar para ver o que ela diz. Esta transição de menina para adolescente traz sempre grandes mudanças.
─ E na Inês parece estar a ser bastante difícil. Mas fala-lhe, por favor! Ela ouve-te melhor do que a nós. Tudo isto me deixa muito angustiada.
─ Ser Adolescente é... Sonhar, Amar, Fazer...Desfazer, Discordar, Dizer...Contradizer, Aquietar...Inquietar, Mudar, Contestar, Agitar, Subverter....Crescer!
─ Mas não deveria ser uma coisa perfeitamente natural, sem conflitos? ─ Inquiriu Pedro que até aí quase se limitara a ouvir.
─ Absolutamente, mas…─ Eduardo hesitou.
─ Mas…
─ Mas algures nos primeiros anos de vida essa naturalidade sofreu uma interrupção. ─ Respondeu Eduardo cauteloso.
─ Como assim?
─ Isso agora não importa muito. Precisamos é de ajudar a Inês.
─ Claro que importa! Já que começaste fala. Tu é como se fosses da família, não precisas de nos ocultar nada. Entre nós nunca houve subterfúgios nem meias palavras. ─ Insistiu Pedro, pressentindo que o amigo trazia alguma acusação implícita nas suas palavras.E aquele encontro prolongou-se até muito tarde.

Continua...