Virtual Realidade

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Saturday, December 29, 2007

Virtual Realidade Parte 117


Depois de ter encontrado os comprimidos, Luísa ligou à filha a dar-lhe as recomendações necessárias para aliviar os sintomas do seu mau estar rapidamente, antes que a crise se elevasse a um grau mais preocupante, e a dizer-lhe que viesse que já tinha o remédio para ela tomar. Não queria admitir, mas continuava a ser a mãe galinha de sempre, preocupada com a sua bebé pintainha do único ovo que havia incubado.
Encontrou o pai de Eduardo e a mãe dela já na sala de jantar numa conversa animada.
─ Bom dia!
─ Bom dia!
─ Já tomaram o pequeno-almoço?
─ Sim filha, nós os dois já. Faltas tu e o Eduardo e não sei se as meninas o tomam em casa da Cristina.
─ Elas vêm já aí! Quando chegarem diga à sua neta para tomar um comprimido daqui. ─ disse Luísa, entregando-lhe uma caixa. ─ Eu tenho que sair.
─ A Rita está doente? Vais onde?
─ Vou buscar os miúdos ao orfanato, mas não demoro. A mãe faça companhia ao Sr. António e não se preocupe com o almoço. A Cristina está prestes a chegar também e trata de tudo com a ajuda das miúdas. Ela já sabe o que tem a fazer.
─ Mas a Ritinha está doente? ─ insistiu a senhora.
─ Parece que está começar uma gripe e daqui a dois dias tem de ir embora.
─ Já?! Pensei que estivesse de férias até ao ano novo.
─ Este ano não passa os anos dela connosco nem o fim do ano. Tem de ir mais cedo.
─ Que pena! Mas a vida dela está em primeiro lugar. ─ lamentou a avó de Rita, conformada.
─ Claro, Mãezinha. Na próxima Primavera vamos as duas a Pamplona visitá-la. Este ano vai ser diferente para todos nós. Eu também vou passar o ano com o Eduardo a casa dele. A mãe podia ir ao Porto passar com a sua amiga, afinal ela está sempre a convidá-la. Pense nisso a sério.
─ Tens razão! Acho que desta vez vou aceitar. Vai-me fazer bem sair da rotina e ter uns dias diferentes.
Depois de terem tomado juntos o pequeno-almoço seguiram rumo a Leiria, passando pelo centro de S. Pedro de Moel. Àquela hora matinal pouca gente andava na rua ainda. Não repararam no jovem casal que ia de mão dada a rir divertidos.
Ele dizia para ela: “Amor já te disse hoje que te amo muito?” Ela a sorrir respondia: “Já, mas podes continuar a dizer.”
Luísa ia distraída a olhar para o mar.
─ Amor, vais muito calada! A pensar na Rita?
─ Desculpa não estar a dar-te a atenção que mereces, mas estou preocupada com a viagem dela para Pamplona daqui a dois dias e doente.
─ Não achas que estás a exagerar? É apenas uma constipação e ela já é crescidinha, saberá ter cuidado.
─ Mas eu sou mãe…
­─ Eu entendo, mas tem calma. Estás com ar tão infeliz que se o Francisco pudesse cá vir eu não me importaria de lhe pagar a viagem. ─ disse Eduardo a sorrir.
─ Pois, se ele pudesse eu trataria dela e ficaria boa em poucos dias. Assim lá sozinha sem ter quem lhe leve um chá quente à cama…
─ Tem a Emília.
─ A Emília tem as aulas dela.
─ Sendo assim, o melhor é ela prescindir de passar o ano com o namorado e só ir quando estiver bem.
─ Se ele pudesse cá vir! ─ repetia Luísa, ruminando a ideia que lhe dava esperança de ter a filha mais uns dias perto de si. ─ Vamos ver como as coisas evoluem.

Chegaram ao portão de entrada do orfanato que estava aberto à espera deles. Luísa entrou no edifício com Eduardo ao lado, o braço dele sobre os seus ombros. Eduardo olhou em seu redor e pensou que um dos seus grandes sonhos seria construir um espaço onde crianças pudessem crescer em liberdade, em que as únicas regras a cumprir seriam apenas as das suas necessidades biológicas.
Depois de toda a burocracia por que tiveram que passar Eduardo puxou a namorada contra si e disse baixinho.
─ O teu coração amante da humanidade, sobretudo da mais esquecida, desprotegida e maltratada, faz de ti uma linda mulher e eu amo-te.
Durante um momento Luísa teve que reprimir as lágrimas e, logo a seguir, sentiu vontade de rir.
Luísa apaixonou-se pelo trabalho da fundação e de caminho mostrou que tinha nascido para ele. Idealista, organizada, apercebia-se dos mais ínfimos pormenores e não media esforços para estar sempre presente.
Já a caminho de casa Eduardo sentia-se feliz e radiante e não se cansava de responder às perguntas que as crianças lhe faziam.
Finalmente chegaram a casa e sentiu-se o aroma do cabrito assado no forno.
Na sala de jantar Rui e o senhor António conversavam quando Eduardo entrou com as crianças e as levou até à árvore de natal dizendo a sorrir:
─ Essas prendas são para vocês. Têm os vossos nomes e cada um pode desembrulhar os seus.
O menino e a menina olharam para ele incrédulos e felizes, apressando-se a pegar nos presentes e a retirar-lhes ansiosamente os papéis.
Luísa apareceu para assistir àquele momento mágico de felicidade que só as crianças são capazes de manifestar.
Abertos os embrulhos, as duas crianças levantaram-se e agarraram-se às pernas de Luísa e de Eduardo num gesto de agradecimento sem palavras pela felicidade que eles lhes haviam proporcionado.
Eduardo e Luísa baixaram-se, abraçando as duas crianças, muito emocionados. Depois sentaram-se todos na carpete e começaram a brincar.
Rui aproximou-se do grupo e perguntou sorridente:
─ Também posso brincar?
─ Fica no meu lugar; vou ajudar a Cristina. A não ser que queiras ir lá tu. ─ respondeu Luísa com um sorriso significativo.
─ Ok, eu vou.
─ Pensando bem, é melhor ir eu! Os dois lá sozinhos ainda me deixam mas é queimar o assado. Fica tu aqui a brincar.
Sentado no chão, Eduardo reviveu momentos da sua infância; os seus brinquedos enquanto criança, piões, berlindes, barquinhos e moinhos que ele próprio fazia em papel. A saudade dum tempo em que via o mundo através do olhar inocente e crédulo do menino que já não era, foi tão grande que sentiu os olhos turvados de lágrimas.
Luísa entrou na cozinha procurando a filha com os olhos.
Encontrou a Cristina e a Sandrine de volta do almoço.
─ Bom dia meninas! Precisam de ajuda?
─ Não. ─ responderam.
─ A Rita onde está? ─ perguntou Luísa.
─A Rita foi-se deitar no teu quarto até há hora do almoço. Deve estar a dormir.
─ Vou ter com ela. Se puderem ir à sala espreitar um belo quadro…
Já no quarto colocou suavemente a mão na testa da filha.
─ Já estás em casa? ─ perguntou a filha, levantando a cabeça.
─ Dorme, dorme ─ sussurrou Luísa.
Aconchegou-lhe as roupas e saiu aliviada. Passou pela sala de jantar e sossegou Eduardo dizendo que a Rita estava a descansar e que não tinha febre, de momento.
Nunca o tinha visto tão feliz. Até o Sr. António participava no jogo dando os seus palpites. Enquanto Sandrine e Emília punham a mesa para o almoço Luísa foi ajudar a Cristina.
─ O almoço está quase pronto ─ dizia Cristina corada com o calor do forno enquanto regava a carne. Só que ainda falta o meu filho com o amigo.
─ E tu, amiga, como te encontras depois dos últimos acontecimentos?
─ Nunca imaginei que uma coisa destas pudesse acontecer comigo, Luísa. Lembras-te do que eu pensava dos homossexuais? ─ dizia Cristina.
─ Lembro sim. Como havia de esquecer-me? Sempre fomos como irmãs. Mas o que importa agora é a felicidade dele.
─ Eu deveria ter sido uma mãe mais atenta. O choque não seria tão grande e ele não teria sofrido tanto como sofreu. Mas podes ter a certeza que lhe darei todo o apoio que devo.
─ Eu sei que sim.
O almoço foi servido com todo o requinte. Rita acabou por vir almoçar à mesa. Sentia-se um pouco melhor. Durante o almoço os pequenos não pararam de falar sobre os novos jogos que tinham. No meio da refeição o telemóvel de Eduardo tocou.
Eduardo pediu licença e retirou-se da mesa.
─ Sim sou eu mesmo! Cátia, minha amiga, como vais tu? Há quanto tempo não falamos! ─ Ultimamente tenho entrado pouco no Mirc. Tiveste um bom Natal?
─ Claro! E tu?
─ Eu também. Queria-te dar uma boa notícia; lembras-te do meu namorado?
─ Claro um moço que conheceste no chat.
─ Precisamente! Pois ele e os pais vieram hoje almoçar a minha casa.
─ Estou feliz por ti e desejo-te tudo de bom.
─ Obrigada! Continuação de boas festas.
Depois de desligar, Eduardo veio para a mesa com um ar luminoso no rosto.

Continua...