Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, September 15, 2006

Virtual Realidade Parte 52


─ Olá, Teresa, olá Pedro!
─ Como vais tu? ─ Perguntou o Pedro.
─ Cá vou indo.
E como os filhos não largavam o Eduardo, Teresa sugeriu:
─ Como já fizeram os deveres podes ir brincar um pouco com eles até ao jantar.
─ Com todo o prazer! ─ E virando-se para as crianças: ─ vamos?
─ Vai tu com a Inês. Lembrei-me agora que ainda me falta estudar uma coisa para amanhã. ─ Respondeu o André com pena de não poder ir brincar também.
─ Vem comigo! ─ Convidou a Inês. ─ Vamos para o meu quarto.
─ Ok, tu mandas!
Eduardo reparou que Teresa olhava para ele ansiosa e a sua cara revelava preocupação.
Entraram os dois no quarto da Inês decorado em tons rosa, muito simples e bonito. Mas aquele quarto já não era bem igual ao que Eduardo conhecia antes. Os cortinados outrora cheios de bonecos e flores, perfeitamente adequados a um ambiente infantil, tinham sido trocados por outros mais «adolescentes», revelando ainda o bom gosto que Teresa tinha para essas coisas, e a filha gostava tanto deles que evitava tudo o que os pudesse estragar. A cobertura da cama, sempre igual aos cortinados, também tinha sido trocada. Uma Inês mais crescida tinha exigido as mudanças. Nas paredes cobertas de posters dos modernos ídolos, cantores, bandas de rock e outros, muito comuns em quartos de adolescentes, quase não se percebia a pintura original.
Eduardo já não via as bonecas nem os brinquedos e até as almofadas tinham sido substituídas por outras mais apropriadas. Tudo muito arrumado e apenas uma boneca grande em cima da cama impecavelmente feita. Os móveis assim como o tapete grande aos pés da cama, que era o mesmo onde costumavam brincar, mantinham-se no nível das novas exigências.
─ Tens aqui um belo quarto, mas está tudo mudado! E tantos posters…
Eduardo, que há algum tempo não visitava os amigos, achou grande transformação na sua Inês, como ele lhe chamava. Tanto física como psicologicamente.
“Uma menina a entrar na adolescência, revelando a insegurança e algum vazio interior «próprios» da idade e causados por uma educação tradicional embora pouco repressiva. ─ Pressentiu ao olhar aquelas paredes. ─ O que queria dizer que os problemas vinham por arrasto. Uma idade difícil, como se costuma dizer, atribuindo erradamente as culpas às transformações fisiológicas que se operam na adolescência”.
─ Senta-te aqui no tapete e vamos jogar um jogo.
─ Não queres antes conversar comigo?
─ Pode ser, mas sobre o quê?
─ Há muito tempo que não falamos e gosto de saber de ti, como vão as coisas na escola, se já tens namorado… As ferias foram boas? Conta-me tudo. Sabes que sei guardar segredos. Somos amigos ou não?
─ Sim, e eu gosto de te contar, mas… ─ E a Inês ficou muito triste de repente. ─ Não sei…
─ Não sabes o quê? Passa-se alguma coisa? Confia em mim e conta-me tudo!
─ Acho que estou metida num problema… Muitas coisas se passaram desde a última vez que falamos. Raramente apareces!
─ Como assim?! Conta-me para eu te poder ajudar.
─ Não sei se podes.
─ Nem eu! Terás de me contar primeiro. ─ Eduardo sorriu, pegou nas mãos de Inês e puxou-a para si abraçando-a e dando-lhe confiança. ─ Vá lá, fofinha, o que podes ter assim de tão grave na tua idade? Conta ao tio Edu que ele promete fazer tudo para te ajudar.
─ Sabes que passei de ano mas baixei muito as notas no terceiro período.
─ Sim…
─ E tenho medo de que no ano que começou não consiga ter boas notas. Estou distraída nas aulas e não consigo estudar.
─ Mas porquê? Sempre foste boa aluna e gostas de estudar! O que é que mudou?
─ Vou contar-te tudo, mas não digas nada aos meus pais. Prometes?
─ Não achas que te devias abrir com eles? Quem melhor te poderia ajudar do que eles que te querem tanto?
─ Eles não me entendem. Eu gostava tanto de ter uma tatuagem e um piercing. A minha amiga ficou muito gira. Prefiro contar-te a ti. Espero que não me arrependa, visto seres muito amigo dos meus pais.
─ Sou também muito teu amigo e os amigos não revelam a outros amigos o que sabem dos amigos, senão não são amigos. ─ Respondeu Eduardo a sorrir dando-lhe confiança.
E Inês, pendurada no pescoço do tio Edu entre lágrimas, começou a contar:
─ Há tempos conheci um rapaz na Internet no IRC
─ Mas tu tens só doze anos!... Já vais para salas de chat? Que idade tem ele?
─ Tem dezasseis anos. Temos falado muito pelo IRC. É super simpático.
─ Já te sentes atraída por rapazes? Pensava que ainda gostavas de brincar com as bonecas. Quando falei se já tens namorado era a brincar.
─ Gosto de falar com ele, temos os mesmos gostos: musica, leitura, e desporto. Mas ultimamente anda com umas conversas esquisitas. Eu não entendo o que quer dizer.
Inês fez uma pausa para limpar as lágrimas com um lenço de papel que Eduardo lhe estendeu.
─ Acalma-te e conta-me tudo desde o início ─ Pediu o tio Edu
─ Foi assim: nas férias da Páscoa comecei a ir ao IRC. Uma amiga ensinou-me. Pouco depois um rapaz veio meter conversa comigo e ficámos amigos virtuais. Começaram as aulas e quando eu vinha para casa passava o tempo com ele no MIRC e não estudava. Ele é muito simpático e gosto muito de estar com ele, mas diz que está longe e que não nos podemos encontrar por enquanto. A minha amiga tem-me dado conselhos. Falo muitas vezes com ela ao telemóvel e tenho gasto montes de dinheiro a carregá-lo. A minha mesada vai toda em pouco tempo e tenho de inventar desculpas para a minha mãe me dar mais dinheiro.
─ Ah! Continua…
─ A minha mãe já anda desconfiada e não sei o que fazer. Queria continuar a poder falar com a minha amiga. Sem ela não era capaz de manter uma conversa com o meu amigo virtual. Ele fala super bem, é muito educado, divertido e sabe muitas coisas.
─ Hum!!! E deixas de estudar para estares com ele?
─ Eu não quero deixar de estudar, mas ele atrai-me muito. O que devo fazer tio Edu?
─ Que tipo de coisas é que ele sabe?
─ Muitas coisas sobre o mundo, a vida, sei lá!...
─ Já pensaste que para quem tem 16 anos parece muita sabedoria?
─ Não sei. Achas?
─ É uma hipótese e acho que deves ter muito cuidado. As pessoas nem sempre mostram aquilo que são e na net ainda é pior.
─ Se ele me anda a enganar e for mais velho não me importo. A minha amiga diz que ele gosta muito de mim e aconselha-me a pedir para me encontrar com ele. Ele também quer isso, mas diz que por enquanto não pode que está longe, mas que um dia será.
─ E a tua amiga tem que idade?
─ Quinze anos.
─ Ah. E se ele for muito mais velho do que tu? Tiver idade para ser teu pai ou mais até do que isso? Tipo quarenta anos ou mais…
─ Achas possível um homem mais velho perder tempo com crianças de 12 anos?
─ Ouve o que te vou dizer! Tem calma, não faças asneiras e confia em mim. Desconfio que estás a lidar com um grande sacana.
Inês começou a soluçar.
─ Não chores, fofinha! A vida é cheia destas coisas, infelizmente. Diz-me uma coisa…tu quando precisas de estudar a sério para um teste, história, por exemplo, isso não custa um bocado? Não tens de ler e ler muitas vezes? É sacrifício, dor e gastos de energia. Pois bem, aprender a viver também custa muito, por vezes, e quando há dor na aprendizagem é quando as coisas ficam melhor gravadas em nós. Se eu descobrir que o gajo é um enganador, tens de estar preparada para aceitar isso como uma aprendizagem boa para a vida. Ganhas experiência e nunca mais cairás noutra. Tu já lhe contaste muitas coisas sobre ti?
─ Sim, ele sabe tudo a meu respeito.
─ A tua idade, o que fazes…deste-lhe alguma fotografia…
─ Sim, tudo isso.
─ Ok. Vais prometer-me duas coisas em troca da promessa de eu não contar nada aos teus pais.
─ Quais?
─ Primeiro vais prometer que não tomarás nenhuma decisão a respeito do tal gajo sem falares comigo primeiro e não farás também nenhuma asneira. Alguma coisa que penses fazer, conta-me primeiro, ok? Fica prometido?
─ Sim, fica! ─ Respondeu Inês com convicção
─ A segunda coisa é que serás tu a contar aos teus pais. Não precisa de ser agora já, mas apenas quando eu te der notícias sobre isto.
─ Mas quando eu lhes contar quero que estejas presente.
─ Conta comigo. Sempre amigos?
─ Sempre!
─ Não descuides os estudos e tenta usar pouco o telemóvel para falares com a tua amiga. Dá uma desculpa qualquer. Andas a pedir conselhos a quem sabe tanto da vida como tu. Agora preciso de saber o nick dele e também o teu, e ainda a tua password associada ao nick.
─ O dele é gato_cinzento e o meu é esmeralda. A minha password é…
─ Ok. Não te esqueças do que eu te disse sobre como deves proceder e aguarda noticias minhas. Tudo vai correr bem, não fiques preocupada.
─ Bigada, tio Edu. ─ Agradeceu Inês beijando na face.
─ Deixa-te disso! ─ Respondeu Eduardo comovido. ─ Vamos ao jogo?
Bateram à porta do quarto.
─ Entra! ─ Disse a Inês limpando os vestígios das lágrimas rapidamente.

Continua...



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