Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, November 16, 2007

Virtual Realidade Parte 111


Sentaram-se na areia, perto da água, lado a lado em silêncio. Os seus olhares atingiam a linha do horizonte, cada uma revisitando as suas recordações.
─ E quando nós… ─ disseram as duas ao mesmo tempo, interrompendo-se com uma enorme gargalhada, ao descobrirem que iam dizer a mesma coisa.
─ Lembrámo-nos do mesmo? O que ias dizer amor? ─ perguntou Luísa.
─ Estava a lembrar-me de quando corríamos nuas, de mãos dadas, na beira da água pela praia deserta.
─ Era também disso que me estava a recordar.
─ Que idade tinha eu, mãezinha?
─ 8, 9 10 anos… Depois começaste a sentir algum pudor e deixaste de alinhar.
─ Via os rapazes a espreitar de lá de longe do alto das rochas.
─ E depois?!
─ Não gostava que me vissem nua.
─ Qual é a vantagem de estarmos nuas se ninguém nos vir? E porque é que o olhar dos outros tem de ser um obstáculo à nossa liberdade, ao nosso prazer?
─ Pois, pensando bem…
─ Eras capaz de fazer isso agora comigo?
─ Se não estivesse frio, era. Acho que já perdi o pudor da adolescência e que me tornei igual a ti nesse aspecto.
─ Que bom, filhota! O teu Francisco também seria capaz de o fazer?
─ Nunca falámos sobre isso.
─ Mas pelo que conheces dele…
─ Penso que sim.
─ É bom sinal. Acho que o Eduardo também. Só devemos gostar de pessoas que não tenham receio de se despirem. ─ sentenciou Luísa a sorrir.
─ Não achas que estás a ser um bocadinho exagerada?
─ Pensando melhor, não de todo. A facilidade em nos despirmos de corpo, excepto para quem se prostitui ou o faça por exibicionismo, implica abertura de espírito, sinceridade, inocência.
─ Talvez para pessoas como nós, para quem a sexualidade é natural e bela.
─ Sim, a grande maioria não sabe o que perde… Já se viram despidos?
─ Como? ─ perguntou Rita apanhada de surpresa.
─ Tu e o Francisco, meu amor! ─ respondeu a mãe com voz terna. ─ Espero que não tenhas receio de me falar dessas coisas.
─ Não, não tenho! Ainda não nos despimos ao pé um do outro.
─ Oxalá, sejas tão feliz com ele, como eu com o Eduardo!

Permaneceram as duas em silêncio por vários minutos. O sol procurava espreitar por entre as nuvens dando alguma esperança de que o dia iria abrir.
Por fim Rita falou:
─ Momentos belos, estes que nos enchem a alma, não é mãezinha?!
─ Tens razão minha querida! Não conseguiria viver longe do mar. Comecei a vir para esta praia na minha meninice e desde logo a adoptei; passei a chamar-lhe” a minha praia”. Ainda bem que viemos aqui um pouco “namorar”. O dia vai ser longo e cansativo, e não teríamos outro bocado para estarmos sós. Daqui a pouco teremos a casa cheia de gente e a nossa vida actual tomará o lugar das nossas memórias e escreverá novas, gratificantes também, para recordarmos mais tarde.
─ Isso é verdade e tu vais ter um dia em cheio, não é mãezinha?
─ E quero que tu tenhas também.
─ Teria se o Francisco estivesse presente.
─ Estou a ver que a minha filhota ficou mesmo presa a esse rapaz! ─ disse Luísa com um sorriso carinhoso, acariciando-lhe os cabelos.
─ Confesso que sim. Já não poderia viver sem ele.
─ Vais ver que o tempo passa rápido e logo estarão juntos novamente. Sempre vais passar os anos com ele?
─ Sim gostava muito e ele ficaria muito feliz.
─ Ele, e tu não?
Era uma pergunta que não esperava resposta, porque já a conhecia de sobra, e Rita permaneceu calada, com ar sonhador, tentando penetrar, com o olhar, a linha do horizonte na espera inútil de ver Francisco aproximar-se empurrado por um vento favorável. Ele havia praticado vela.
─ Não me queres falar um pouco desse namoro? ─ perguntou a mãe.
Rita acabou por confidenciar à mãe todas as alegrias e dúvidas dos últimos tempos. Acabando por falar da sua amiga Maria. Que a achava muito estranha e que lhe parecia ser mentirosa compulsiva, pelos enredos que arranjava no meio estudantil. Ela tinha-lhe contado que tinha andado com o Francisco, mas não sabia se devia acreditar.
─ Não te deixes magoar por ninguém, as aparências por vezes iludem. Se tens dúvidas sê frontal com ele. Se foi verdade respeita o seu passado. E, afinal, pode até nem ser verdade.
Onde é que ela o conheceu e como?
─ Ele e ela moram no mesmo prédio, mamã!
─ Ah! Sendo assim, já se viram com certeza. Mas isso não prova nada. E daí? Se foi e já não é depois que te conheceu…
─ É essa a minha dúvida.
─ Tu é que o conheces e sabes a confiança que podes ter nele, mas não deixes que a dúvida te apoquente. Fala com ele. Muitas vezes, o que parece complicado torna-se simples, quando falamos frontalmente com as pessoas.

Rita muda de tom e pergunta à mãe:
─O Eduardo e o pai sempre vêm para almoçar? Por falar em Eduardo, o pai do Francisco também se chama Eduardo!
O pensamento de Rita ficou, por segundos, a quilómetros dali, mas sorriu para a mãe.
─ Coincidência! Sim, eles vêm almoçar. É melhor irmos andando. O trabalho espera por nós.
Repentinamente levantou-se e puxou a filha pela mão; as duas riam felizes e o seu riso ecoava naquela praia paradisíaca.
Próximas de casa, caíam do céu minúsculas gotas de água, como que arrependido de, minutos antes, ter deixado espreitar o sol. Correram para dentro e tiveram uma enorme surpresa porque não haviam suspeitado de que o tempo voara.

Continua...