Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, February 15, 2008

Virtual Realidade Parte 124


Há muito que S. Pedro de Moel estava coberta pelo manto translúcido da noite quando Eduardo e Francisco chegaram. Abrigada pela esplêndida concha de casario, a povoação, pacata e deserta, jazia em paz, prostrada nas suas ruas de paralelos apenas iluminadas pela luz pública dos candeeiros eléctricos.
O frio obrigara as pessoas a permanecerem aninhadas no aconchego das suas casas e
só se ouvia o suave murmúrio do mar.
Por sobre aquele silêncio quase total que envolvia a povoação, uma sentinela indiferente ao tempo e ao sono, velava pela tranquilidade dos seus habitantes: era o farol que lançava o seu olhar luminoso, em permanente vigilância, varrendo cada telhado a intervalos regulares na sua costumeira ronda circular.

As três amigas tinham ido para o quarto arranjar-se para o jantar. Rita estava ansiosa pela chegada do namorado e não parava quieta um segundo. Sandrine, mais calma, avisou:
─ Se queres que te ponha bonita, senta-te quieta se fazes favor, senão desisto!
─ Mas para quê tanta coisa? Ele gosta de mim pelo que eu sou e não pelo que pareço.
─ Ai é?! Então não faço nada. Ficas assim desgrenhada e pálida.
─ Isso não, mas também não se trata de preparar a noiva para o casamento.
─ Fica sossegada senão chamo a tua mãe para te bater! ─ ameaçou Sandrine a brincar.
─ Eu seguro-a. ─ ofereceu Emília, ocupada a escolher o guarda-roupa, entrando na brincadeira. ─ O melhor é amarrá-la à cadeira.
Rita, que ainda se encontrava um pouco debilitada pela gripe, acabou por se deixar levar por elas, fizessem o que quisessem dela. Só lhe importava que Francisco entrasse por aquela porta e a enchesse de miminhos e não parava de olhar para o relógio. Parecia-lhe que os ponteiros não se mexiam.

Em Pamplona, Mariana olhava angustiada para o telefone ainda não acreditando no que lhe havia acontecido. O filho desligara repentinamente, mas ela tinha ouvido com nitidez aquelas palavras, «Não se preocupe que o seu filho está em boas mãos», e ficou a pensar, “será que o Eduardo que foi esperar o meu filho ao comboio é o mesmo Eduardo … ? Não pode ser! O destino não me iria pregar tamanha partida!”
Neste dilema, esperava ansiosa que Juan chegasse a casa para desabafar os seus receios.

Luísa e Cristina preparavam o jantar com todo o requinte; queriam que tudo saísse bem. O Rui e o Daniel chegariam a qualquer momento das compras de última hora que tinham ido fazer para o jantar. O Rui adorava petiscos e gostava de surpreender o amigo.
Nas últimas horas a chegada próxima de Francisco havia-se tornado no motor que agitava toda a gente naquela casa.
Dizia Luísa para amiga enquanto punha o tabuleiro no forno:
─ Sinto que andas nas nuvens… como que em lua-de-mel!
─ Olha quem fala!
─ Mas eu tenho tido muito trabalho e responsabilidade e tu nunca mais foste dormir a casa, sua marota!
─ Por isso é que tenho dormido pouco. ─ respondeu Cristina com um sorriso significativo.
─ Imagino que sim! ─ riu Luísa.
─ Olha, amiga! Só desejo que sejas tão feliz como eu o tenho sido nestes dias. ─ disse Cristina com melancolia na voz.
─ Que tom é esse, amiga? ─ perguntou Luísa acariciando-lhe os cabelos. ─ Ainda agora parecias tão feliz!
─ O que é bom acaba depressa e, acabando as festas, volta tudo à rotina anterior. E não me posso esquecer dos problemas que estão para chegar.
─ Tens razão, mas pensa que esses problemas serão o último obstáculo que te separa ainda da felicidade total. Vais ver como tudo ficará perfeito depois.
─ Oxalá!
─ A Sara e a polícia estão a preparar tudo e o Victor vai com certeza ser apanhado em breve. Ainda nos vamos rir disso tudo, vais ver. Agora anima-te que hoje também é dia de festa!
─ Tens razão, desculpa! Por falar em Sara, tu conhece-la pessoalmente? Já tenho notado que o Eduardo fala dela com um grande carinho e sempre com elogios. Não tens ciúmes?
─ Querida, para ser franca, não posso negar que às vezes, mesmo sem querer, uma pontinha de ciúme aflora ao meu coração. Mas o Eduardo é uma pessoa racional, muito humano e, sobretudo, defende a honestidade. Acredito que, depois do amor da juventude, eu sou a mulher que ele ama. Nunca mais se apaixonou por ninguém, não é homem que se apaixone com facilidade. Sabes que ele sofreu durante anos por aquele amor de juventude. Eu sempre o compreendi até que um dia ele se declarou a dizer que eu devagarinho tinha entrado no coração dele.
─ Entendo!
─ Agora gostava, era de lhe dar um filho, será que ainda vou a tempo?
─ Ainda estás na casa dos quarenta, não és assim tão velha, mas é sempre um risco.
─ Não vamos falar nisso agora. Temos que estar bem-dispostas para receber o meu futuro genro! ─ dizia Luísa sorrindo, para desanuviar o ambiente que, de repente, tinha ficado pesado.
─ Tens razão! Vou ligar ao Rui para não se demorarem.
Enquanto Cristina ligava ao namorado e trocava com ele palavras de carinho, Luísa, preocupada com a demora, ligou ao Eduardo a saber se ainda estavam longe.
─ Quanto tempo demorarás ainda, amor? ─ perguntou.
─ Dentro de meia hora estaremos aí. ─ mentiu ele, por brincadeira, já que estavam a cem metros de casa.
─ Tanto tempo ainda? Não me estás a esconder nada, amor? ─ perguntou ela desconfiada.
─ Claro que não, fofinha! Está tudo sob controlo, não te preocupes! Até já!
─ Cá estamos! ─ disse Eduardo a Francisco, saindo do carro e indo tocar à campainha.
Cristina abriu a porta e foi a primeira a conhecer o Francisco.
─ Vamos entrando. ─ avisando para dentro, gritou: ─ Luísa, já chegaram!
─ Quem? ─ perguntou Luísa, da cozinha.
─ O Eduardo e o Francisco!
─ Grande maroto! ─ disse Luísa aparecendo ─ Acabaste de me dizer que estavas a meia hora de distância! Isso faz-se? ─ virando-se para o namorado da filha: ─ Desculpe, mas este homem precisa de uma lição!
─ O que vai pensar o rapaz se o recebes com uma cena destas? ─ perguntou Eduardo a rir.
─ A cena não é com ele, é contigo, meu maroto! ─ e para Francisco: ─ ponha-se à vontade que a Rita já vem. Sinta-se em sua casa.
─ Obrigado! ─ respondeu Francisco, sorrindo.
Cristina entrou no quarto das raparigas em bicos dos pés ─ elas assustaram-se com a aparição:
─ Meninas, os cavalheiros acabaram de chegar.
─ Estou bem! ─ perguntou Rita fazendo meia volta.
─ Estás deslumbrante, querida! E vocês também estão bonitas.
Rita foi a primeira a correr para fora do quarto. Abriu a porta e caiu nos braços do namorado. O beijo foi demorado, mas ninguém se importou; nem o Eduardo que estava atrás deles para passar.
─ Estou tão feliz por estares aqui! Quero que te sintas como se estivesses na tua própria casa ─ disse Rita, olhando-o nos olhos, agarrada ao braço dele.
Depois de todas as apresentações, foram para a mesa. O jantar esperava por eles.

Continua...