Virtual Realidade

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Friday, November 02, 2007

Virtual Realidade Parte 109


Com o Natal a três dias de distância, Luísa, em casa, embrulhava as prendas em papel ilustrado com motivos da época, e aplicava, a cada uma, um laço de cor diferente e um cartão com o nome do destinatário.
O Natal era, para ela, mais um pretexto para reunir a família em casa do que outra coisa qualquer, e atribuía sempre algum simbolismo a cada uma das prendas, que adorava distribuir nessa ocasião, numa dedicatória adequada a cada familiar ou pessoa amiga que a iria receber.

Cheia de entusiasmo, queria ter tudo pronto e escondido quando as «miúdas» chegassem; tinha planeado ser ela e o Eduardo que, na véspera do Natal, quando já todos dormissem, colocariam os embrulhos junto da árvore para que depois cada um retirasse o seu quando se levantasse da cama.
Quando acabou, colocou as prendas junto da árvore, como actores num palco para o ensaio geral antes da estreia, afastou-se um pouco para olhar o conjunto e gostou do trabalho. Depois retirou-as e guardou-as fora de olhares indiscretos.
Nunca se sentira tão empolgada com os preparativos do Natal como neste ano em que contaria com a presença de Eduardo e recordava o dia em que o tinha conhecido em pessoa. E ele viria com o pai que ela ainda não conhecia. Rita, a filha ausente havia quase três meses, já tinha chegado na véspera para lhe matar as saudades. Quase ao mesmo tempo, como se tivessem combinado, havia chegado Sandrine, a filha torta. Cristina tinha confirmado que estaria presente com o filho, uma vez que Victor lhe comunicara que iria estar em viagem por essa altura, o que ela achara uma grande ideia. O Rui também viria. E a mãe, claro, a mãe.
Um inesquecível Natal em perspectiva, onde tudo parecia conjugar-se antecipadamente, para o transformar no mais perfeito dos dias da sua vida. Só ainda não sabia muito bem onde arrumar tanta gente naquela vivenda que não era assim tão grande, mas isso não a preocupava em demasia. Cristina seria a sua salvação.
Os arranjos de Natal, para além da árvore com luzes intermitentes e uns poucos de enfeites, resumiam-se a um centro de mesa de pinhas pintadas em dourado e azevinho.

Rita e Emília, chegadas de Pamplona na véspera e já refeitas da cansativa viagem, tinham saído com Sandrine para as compras de última hora.
De repente o silêncio é cortado por um barulho forte e batido, sempre ao mesmo ritmo. Levantou-se e chegou à janela para ver a chuva intensa que, nesse momento, se abatia sobre a praia, quase impedindo de ver o mar. “Que belo dia para sair às compras! Espero que não tenham sido apanhadas.” ─ pensou.
Horas mais tarde as três jovens chegaram a casa. A chuva havia passado e vinham muito animadas carregando vários embrulhos. Emília vestia umas calças de ganga e uma camisola amarela de lã. Tinha o cabelo apanhado numa trança comprida e pesada que lhe descia do lado direito sobre o peito. Parecia Cleópatra. Sorrindo cumprimentou-a:
─ Buenas tardes!
─ Olá Emília!
Luísa olhava admirada e curiosa para tantos embrulhos coloridos.
─ Assaltaram algum banco?
Sandrine aproximou-se de Luísa, e fez-lhe uma festa no rosto.
─ Mãe torta, a culpa é tua! Este ano decidiste convidar muitas pessoas. Acho que foi uma ideia maravilhosa; já tinha saudades de uma grande festa cá em casa.
─ Pois é, Meninas, mas tudo isto dá muito trabalho e eu vou precisar da vossa ajuda, para fazer os bolos e os salgados.
─ Tambien me gustaria poder ayudar! Disse Emília timidamente.
─ Claro que conto contigo também. Nós as quatro somos as da casa, temos de preparar tudo para receber bem os convidados. ─ respondeu Luísa a sorrir.
─ Pensavas que a minha mãe te ia poupar? ─ perguntou Rita a brincar, para que a amiga se sentisse descontraída e fazendo parte do ambiente. ─ Se isto fosse uma quinta, a esta hora já teríamos ordenhado as vacas e escovado os cavalos!
─ Tu és terrível! ─ disse Sandrine a rir. ─ Olha que a nossa amiga ainda acredita e nunca mais vai querer cá voltar.
─ Não acredita nada! A minha mamã, apesar de nos obrigar a trabalhar, é doce como mel!
─ Doce como mel?! Vocês vão ver o que vos espera, minhas meninas! ─ ameaçou Luísa a rir com o dedo espetado no ar ─ Devem estar é muito mal habituadas!
─ E o trabajo nos une también. ─ disse Emília, sentindo-se no meio daquelas três mulheres como se estivesse em casa da família..
─ Es verdad! Não te esqueças mãezinha que eu tenho direito a duas prendas, a do Natal e a dos anos ─ disse Rita sorrindo e encaminhando-se para o seu quarto que partilhava com a “irmã torta”. Era um quarto grande de cama dupla e onde tinham armado um divã de emergência para a Emília.
Ao entrar, Sandrine já arrumava as compras e Rita poisou as dela e disse:
─ Vamos mostrar a praia à Emília? Aproveitar enquanto a chuva não regressa…
─ Vamos. Deixa-me só acabar de arrumar isto. ─ respondeu Sandrine.
Luísa, amando e amada, com a casa cheia de juventude, irradiava felicidade e sentia-se como se tivesse voltado muitos anos atrás. Era da idade da filha.
Sandrine já estava a par dos últimos acontecimentos sobre a mãe torta e Eduardo assim como sobre a Rita e Francisco. Ela e a filha estavam ansiosas por conhecer o homem que a mãe trazia no coração.
Afinal voltou a chuva, quando estavam para sair e Rita ligou o computador e foi ao MSN. Estava cheia de saudades de Francisco, mas ele não se encontrava online. Então ligou o Mirc e encontrou «Imagem», o seu amigo virtual do irc.
Imagem ─ Olá menina linda! Há quanto tempo!
AtiR ─ Oi! O mesmo digo eu! Andas desaparecido?
Imagem ─ Muito ocupado ultimamente. Peço-te desculpa, mas tenho mesmo que sair. Ainda apareço para te desejar bom Natal. Beijocas.
AtiR ─ Beijos. Até outro dia.
“Que estranho! Algo mudou neste rapaz.” ─ ficou ela a pensar.
E naquele momento a janela do MSN piscou.
─ Olá amor! Como vais? Muito atarefada com as compras de Natal? Já vim ao MSN várias vezes e não havia meio de te encontrar.
─ Mas amor, cheguei ontem e falámos à noite por telefone! As saudades são assim tantas?
─ Não, nenhumas, mas esta manhã, ao sair para o trabalho, a cidade formava um belíssimo cenário, coberta com um manto branco sobre as ruas e os telhados, a contrastar com o azul límpido do céu e pensei que gostarias de ver. Ando aqui sozinho...Quem amo está longe e não pode apreciar estas belezas comigo. Bateu bem forte a saudade. Saudades de ti meu amor. Devia ter ido contigo, sempre estava melhor!
─ Amo-te, meu amor! Espera por mim. Felizmente, falta muito pouco. Nem uma semana para estarmos novamente juntos. Prometi ir passar os meus anos contigo e irei.
─ Já falaste com a tua mãe? Será que vai concordar?
─ Não te preocupes, a minha mãe quer-me ver feliz! Já lhe falei de nós e ela apoia-me incondicionalmente. Notei que está ansiosa por te conhecer, assim como eu por conhecer o namorado dela. Chama-se Eduardo, mas só o conhecerei na véspera do Natal.
─ Também é o nome do meu pai que não conheço.
─ Ainda não me falaste dele.
─ Pois não! Ainda não calhou, mas em breve falarei. E a Emília está a gostar da estada? Dá-lhe beijos nossos. A minha mãe e o Juan estão a mandar-te beijinhos também.
─ Ainda não teve tempo de avaliar, mas creio que sim. Está a falar com a minha mãe, entendem-se muito bem.
Sandrine aproximou-se do monitor e foi cuscar a foto de Francisco. Fez sinal à Rita de que era muy guapo.
Despediu-se rapidamente, esperavam por ela para ajudar nos preparativos, prometendo que à noite falariam pelo telefone.
A saudade, sentimento que nos invade nos momentos em que tanto desejamos partilhar algo com a pessoa amada, que por força do destino está longe de nós, mas bem dentro do nosso coração.
As três amigas depois do jantar, foram para o quarto, embrulhar o resto dos presentes, e não permitiram a presença da Luísa.Antes de irem dormir, beberam um chá que Luísa lhes deixara num bule. Inexplicavelmente e apesar da fadiga, naquela noite a Rita não conseguiu enganar a insónia. O rosto do Francisco bailava à sua frente, pedindo-lhe que regressasse depressa. No seu cérebro deslizavam cenas românticas, cintilavam ideias egocêntricas, enquanto no coração apaixonado ecoavam palpitações ardentes.

Continua...