Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, June 09, 2006

Virtual Realidade Parte 39


Rita estava hipnotizada e incapaz de balbuciar qualquer palavra; ela que tinha sempre tanta presença de espírito em qualquer lugar, acabou por se sentar sem responder nada.
─ Olá! Meu nome é Francisco e vivo em Pamplona.
O olhar dele era tão acolhedor e a apresentação tão franca que Rita rapidamente recuperou a presença de espírito e apresentou-se também:
─ O meu é Rita e vou para Pamplona estudar.
─ Que coincidência! Conheces a cidade?
─ Não, nunca lá estive. Vou agora pela primeira vez para me inscrever na Faculdade de Medicina. Viajo com a minha mãe.
─ Preferiste vir para Espanha do que tirar o curso em Portugal?
─ Por uma décima não consegui lugar lá e para não ficar um ano parada e tentar de novo, candidatei-me a várias faculdades espanholas e fui aceite em Pamplona.
─ Estou a perceber. E já tens onde ficar?
─ Vamos tratar disso agora.
─ Eu estou sempre muito ocupado, mas se precisares de alguma coisa telefona-me. ─ Francisco puxou de um cartão de visita e entregou-o a Rita ─ Toma o meu contacto.
Rita recebe o cartão de Francisco e as mãos de ambos tocam-se suavemente; sente uma ligeira vibração naquele toque e retira as suas rapidamente.
─ Obrigada! Certamente que vou precisar, não conheço nada da cidade e muito pouco da língua.
─ Fala-se castelhano o que facilita bastante, em certas zonas de Espanha os dialectos são muito difíceis e nem entre eles se entendem.
─ O que fazes em Pamplona, estudas?
─ Estou a estagiar arquitectura.
─ Agora tenho que ir. ─ Rita levantou-se fazendo menção de sair. ─ Muito prazer e uma boa continuação de viagem.
─ Fica mais um bocadinho! Acabei de te encontrar e já te vais embora?
─ A minha mãe deve estar preocupada.
─ Eu vou lá pedir-lhe desculpa por te ter prendido.
A expressão sorridente de Francisco era tão franca e meiga que Rita se sentou de novo.
─ Ok. Só mais uns minutos. Estás há muito tempo em Pamplona?
─ Cerca de meio ano e vou estar outro meio, pelo menos. Depois penso regressar a Portugal para trabalhar lá.
─ E gostas do teu trabalho, da Arquitectura?
─ Gosto muito! Foi o meu sonho desde miúdo tirar este curso. E tu?
─ Medicina também foi o meu sonho de menina: comecei por dissecar as bonecas que me a minha mãe me comprava. Adorava fazer aquilo. Mas em vez de as curar deixava-as moribundas e algumas morriam.
─ Pois eu, nos primeiros anos de escola, com 6 ou 7 anos, passava pelos prédios em construção e divertia-me a quebrar tijolos, quando não estava lá ninguém a trabalhar.
Riram os dois, numa gargalhada uníssona e intensa que despertou a atenção dos frequentadores do bar naquela hora tardia e madrugadora, passada sobre carris, a alta velocidade.
Francisco foi o primeiro a recuperar do abandono hilariante:
─ Já não falta muito para chegarmos a Vitória; depois é só apanhar a ligação para Pamplona.
─ Nós vamos ficar dois dias em Vitória e conhecer um pouco a cidade aproveitando esta viagem.
─ Temos um projecto em construção em Vitória. Se pudesse ficava e mostrava-vos a cidade, mas tenho de seguir para o trabalho. Estou a regressar de uma semana em Portugal onde fui tratar de assuntos relacionados com a minha situação.
─ Ah. È pena! Depois mostras-me Pamplona, se puderes.
─ Com todo o gosto! Durante a semana é muito difícil estar livre: trabalho desde as 9 da manhã até às 14 e depois das 16:30 até às 20 ou 21 horas, e algumas vezes também nos sábados e domingos, mas não deixes de me telefonar.
─ Isso é muita coisa! ─ Admirou-se Rita.
─ Temos de cumprir os prazos das entregas dos projectos. Não podemos falhar.
─ Já percebi. De onde és em Portugal?
─ Faro. E tu?
─ Leiria, mas moramos em S. Pedro de Moel.
─ Estive lá uma vez. É muito lindo.
─ Sim, é. Estamos a parar!
─ Deve ser Miranda de Ebro. Ainda faltam uns 20 minutos para chegarmos a Vitória.
─ Sim, mas tenho de ir. Até Pamplona! Gostei muito de te conhecer.
─ O prazer foi meu. Fico aguardar o teu telefonema.
Despediram-se com um beijo e Rita saltou ao encontro da mãe. Encontrou-se com Anabela a meio caminho:
─ Ah, já aí vem! A sua mãe estava preocupada e eu tenho de sair nesta estação e queria despedir-me de si. Vamos!
Entretanto o comboio tinha feito paragem em Miranda do Ebro. Entre beijos e abraços Anabela despede-se das novas amigas.
─ Oh mãezinha realmente atrais este género de pessoas: ou necessitadas monetariamente ou deprimidas (risos)
─ Bem, que eu saiba desta vez foste tu que me apresentaste, estás a seguir o meu caminho. Mas agora conta-me por onde andaste…
─ Perdoa, mãezinha! Fiquei retida no bar a falar com o Francisco.
─ Francisco?!
─ Sim, aquele moreno dos olhos lindos.
─ Ah! Estou muito admirada! E como foi esse encontro que demorou tanto?
─ Demorou?! Eu achei até muito rápido!
─ Estou a ver…─ Luísa sorria.
─ Não estás a ver nada mamushka! Quando saíamos do bar eu fiquei para trás e ele convidou-me a sentar, apresentou-se, trocámos umas palavras. Apenas trocámos conhecimento.
─ Com a promessa de se voltarem a ver? Mas não me apercebi de nada! Estavas ainda distante dele.
─ Como adivinhaste?
─ Eu sei muitas coisas. Mas tem cuidado, filhota. Tu não sabes nada dele.
─ Sei muitas coisas…É português, Arquitecto, 24 anos de idade…
─ Isso parece o livro do Bernardo Santareno!

O percurso decorria normalmente, quando Rita tirou do bolso do casaco um cartãozinho e começou a ler. A mãe pediu-lhe para abrir um pouco a janela, e naquele momento o cartão foi arrastado pela ventania para fora do comboio. Rita ficou estática a olhar o pequeno papel que se escapava irremediavelmente, levando com ele a possibilidade de se encontrar com Francisco um dia em Pamplona.
─ Afinal está um vento gélido, fecha a janela por favor. ─ Luísa viu a filha petrificada, o olhar desesperado perdido algures num ponto do espaço lá fora. ─ O que se passa? Parece que viste um fantasma!
─ Nem sabes o que acabou de me acontecer! Eu tinha na mão o cartão do Francisco e quando abri a janela, com o vento, ele voou. Que chatice! Ele ofereceu-se para nos ajudar em Pamplona e achei-o muito simpático. Pareceu ser uma pessoa de confiança.
─ Minha querida lamento muito! Tudo por minha culpa. Vai até ao bar, pode ser que o encontres. Explica-lhe o que aconteceu e pede-lhe outro.
Rita nem respondeu á mãe e voou até ao bar. O lugar onde o Francisco esteve sentado estava vazio. Sentou-se no mesmo sítio em que ele estivera sentado poucos minutos antes, e vagueou pelas lembranças dos acontecimentos acabados de viver, na esperança de que Francisco aparecesse de novo.
“Será que a Sandrine adivinhou ao dizer que iria aqui em terras espanholas encontrar o amor da minha vida? Estou a ficar doida! Não posso pensar nisso agora! Primeiro, os meus estudos”. E voltou para ao pé da mãe mais confiante.
Luísa aproveitou aqueles momentos em que ficou sozinha, e tirou o telemóvel da carteira. Mandou uma mensagem para o e-mail do Eduardo, que digitou o seguinte:

Olá docinho! A viagem está a correr muito bem. Estamos a chegar a Vitória. Tenho saudades tuas! Fica bem. Até breve! Mil beijinhos doces.

Rita aproxima-se da mãe com um ar muito estranho.
─ Encontraste-o Rita?
─ Não mãezinha! Estive a pensar que primeiro tenho os estudos. É neles que tenho que me concentrar neste momento. Vou esquecer este incidente.
Entretanto o comboio tinha parado em Vitória.

Continua....