Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, July 25, 2008

Virtual Realidade Parte 146


Eram precisamente nove e meia da manhã quando Sara chegou à gare de Aveiro onde Eduardo a aguardava.
A felicidade que irradiava apresentava-a a uma nova luz que ele não conhecia e, olhando-a intensamente, procurou penetrar aquele mistério que lhe pareceu insondável.
─ Bom dia, Sara!
─ Olá Eduardo, bom dia! Porque me olhas assim, parece que nunca me viste?!
─ Acho-te diferente, ─ respondeu a sorrir, abraçando-a ─ aí há mistério!
─ Sim há. Estou tão feliz que não podes imaginar! Sabes, aquela felicidade que nos bate bem no fundo da alma e é tão rara!
─ E não posso deixar de notar que isso te faz mais bela ainda, se tal é possível!
─ Oh, amabilidade tua!
─ Nunca minto por amabilidade. Mas diz-me, far-te-ia falta passares um pouquinho dessa felicidade para mim?
─ Claro que não, vim mesmo ansiosa todo o caminho a tentar descobrir como havia de a partilhar contigo, sim porque esta felicidade também é tua!
─ Como assim?! Não percebo nada.
─ Meu amigo, depois de tantos anos e, de certo modo também, graças a ter-te conhecido, encontrei a minha querida Mariana.
─ Ah sim, diz-me tudo!
Em poucas palavras, Sara contou-lhe o que tinha acontecido através de um simples telefonema e viu a expressão dele alterar-se, a emoção tornar-se-lhe mais profunda no olhar, e sentiu que, naquele momento, o mundo parara para ele.
Só ao fim de uns minutos Eduardo conseguiu articular:
─ Quer dizer que o Francisco é meu filho?
─ Quase de certeza, só falta ela confirmar. Parabéns papá!
Eduardo estremeceu e as lágrimas saltaram-lhe dos olhos.
─ Abraça-me outra vez! ─ pediu ─ Diz-me que sou eu que estou aqui a passar por isto!
─ Mas és tu mesmo, tontinho! Tens um filho lindo e eu, um sobrinho adorável.
Abraçou-o e gostou de o sentir apoiar-se nela.
─ Eu bem que simpatizei muito com ele, mas estava longe de imaginar… Estive tão perto dele sem saber!
─ Não podias adivinhar, mas talvez o coração já to dissesse.
─ Achas?! ─ perguntou incrédulo.
─ Acho e parece-me que ele também gostou de ti. Algumas vezes vos vi juntos a conversar animadamente e a tirar fotografias. Agora, retrospectivamente, pareceram-me de facto pai e filho, mas na altura não o teria imaginado.
─ Achas que ele é parecido comigo?
Sara sorriu e respondeu:
─ Sim, no modo de sorrir e na voz calma e doce, mas muito masculina. Não estás feliz?
─ Estou, claro que estou, mas ainda não digeri bem a situação.
─ Eu já e também estou muito feliz. Vamos comemorar?
─ Sim, podemos ir. Qual é a tua ideia?
─ Convidas-me para jantar e conversamos o resto.
Já quase recomposto do choque disse:
─ Ok, mas calma! Primeiro temos um longo dia pela frente; não te esqueças que hoje é um dia singular.
─ Tens razão temos que nos concentrar. Vamos embora que já estamos atrasados.
Eduardo pôs lhe um braço em volta dos ombros e levou-a para o carro.
─ Diz-me só mais uma coisa, contaste-lhe que me conhecias?
─ Não, não contei.

Devidamente industriada pela polícia, Inês dirigiu-se para o ponto de encontro levada por Sara e pelo tio Edu, que a deixaram a uma distância em que não pudessem ser vistos pelo Victor na companhia dela. O local havia sido escolhido pelas forças policiais de modo a facilitar-lhes a operação. Victor preferia outro mais frequentado, mas Inês, instruída, desculpou-se que não queria ser vista por conhecidos e ele, sem suspeitar de nada, acabou por concordar.
Sara e Eduardo juntaram-se a Teresa e Pedro, sentados numa esplanada próxima de onde podiam ver perfeitamente Inês e quem chegasse perto dela. A presença dos pais à vista era importante para a menina se sentir apoiada. Todos nervosos, Eduardo apontou disfarçadamente a máquina fotográfica, munida de teleobjectiva longa, fixando antecipadamente a distância focal.
Da polícia, nem sombra! Apenas Sara, que conhecia bem o seu modo discreto e invisível de actuar em circunstâncias semelhantes, sabia que eles estavam em cima do caso. Ninguém suspeitaria, ao passar por ali ocasionalmente, que dentro em pouco se iria passar naquele local, habitualmente pacato, uma arriscada e dramática operação policial.
─ Eu não aguento mais esta espera! ─ desabafou Teresa.
─ Tem calma, amor, é pela nossa filha! Temos de aguentar. ─ animou Pedro.
─ Ai filha, em que situação nos meteste!
─ Ela é a menos culpada de todos, mas não é agora tempo de estarmos a atribuir culpas. Tem calma que tudo correrá bem. ─ disse Eduardo.
Um quarto de hora de ansiedade, quando viram um carro dar a volta ao quarteirão, devagar, sem se deter junto de Inês.
─ Parece-me suspeito aquele carro! ─ notou Sara.
─ Achas? ─ perguntou Eduardo. ─ mas não parou.
─ Está a avaliar o local e a ver se alguém suspeito anda por perto. Táctica militar. Ele sabe o que faz.
─ Estou a ver. Eram dois no carro.
Passados cinco longos minutos o carro regressou lentamente, parando próximo do local onde Inês se encontrava. Um sujeito muito novo, 18 a 20 anos, de boa compleição, saiu e dirigiu-se a ela.
─ Mas não é ele! O gajo não é muito mais velho? ─ admirou-se Eduardo.
─ É uma rede, não te esqueças. Eles sabem que se lhe aparecesse um mais velho ela podia não querer ir com ele sem recorrerem a violência. ─ explicou Sara.
─ Já contavas com isso?
─ Já. Ele dizia que tinha 19 anos.
A distância não lhes permitia ouvir o que diziam. Só a polícia sabia o que se passava e gravava as palavras a partir de um microfone que Inês levava escondido debaixo da roupa.
─ Que se irá passar agora? ─ perguntou Pedro ansioso.
─ Agora é com a polícia. Eles é que sabem quando actuar, mas penso que será antes de ela entrar no carro. A Inês tem instruções para demorar o mais possível fora do carro e puxar pela conversa, para eles gravarem provas. Esperemos que consiga o que eles querem.

Naquele mesmo instante, longe dali, Luísa e Cristina estavam ansiosas e preocupadas sem notícias do que se estava a passar. Eduardo ficara de ligar para lhes dar conta dos acontecimentos e não havia meio de o fazer.
─ Estou com um pressentimento horrível. Não suporto mais esta espera. ─ desabafou Cristina triste e deprimida.
Luísa abraçou-a carinhosamente.
─ Tem calma, não te atormentes. Vai tudo correr bem. Só nos resta esperar.

─ Olhem, o sujeito dentro do carro faz sinais ao outro para se apressar. ─ notou Eduardo.
─ É natural. Tenham calma, dentro em breve tudo se precipitará! ─ aconselhou Sara.
─ Meu Deus, a minha querida filha! ─ desabafou de novo Teresa com a cabeça entre as mãos. ─ Que irá acontecer?
─ Vai tudo correr bem, amor, acalma-te! Daqui a pouco já tudo passou e foi apenas um pesadelo ruim! ─ animou Pedro puxando a cabeça da esposa para o ombro, afagando-lhe os cabelos.
─ Então, menina, o Pedro tem razão! ─ disse Eduardo, ajudando a animar a amiga.
─ Nem se vê a polícia, acham que está perto?
─ Tenho a certeza. ─ afirmou Sara peremptória.
Eduardo fazia a máquina fotográfica disparar continuadamente.
─ Olhem tantos de armas em punho!
Polícias à civil apareciam de vários lados e o carro, mantido sempre com o motor ao ralenti, arrancou com grande chiadeira. Ouviram-se vários tiros, o carro a despistar e a bater na esquina de um prédio, ficando imobilizado. O rapaz foi logo ali, sem reagir, detido por dois polícias, enquanto outros se dirigiam para o carro despistado de armas em riste.
Os quatro levantaram-se da esplanada, dirigindo-se a correr para junto de Inês que se abraçou à mãe a chorar convulsivamente.
─ Já passou tudo, minha querida. Fica tranquila agora que continuamos do teu lado.
─ Eu tive muito medo! ─ balbuciou a pequena ainda a tremer.
─ Mas portaste-te muito bem! ─ elogiou Eduardo, acariciando-lhe os cabelos. ─ Parabéns!
─ Sim, Inês, não podia ter sido melhor! ─ corroborou Sara, dando-lhe um beijo. ─ Portaste-te como uma mulher crescida.
Entretanto um inspector vindo do carro e conhecido da escritora, aproximou-se deles e informou:
─ O cúmplice está morto. Uma bala atingiu-o na cabeça quando tentava fugir.
─ Identificaram-no? ─ perguntou Sara.
─ Victor Pereira, capitão do exército. Conheciam-no?
─ Mais ou menos. Obtiveram informações importantes?
─ Com o que temos vamos conseguir desmantelar uma rede de pedofilia. Agradecemos também a esta menina. ─ disse o inspector a sorrir. ─ Mas para a próxima, mais cuidado com quem falas na internet.
─ Esta serviu-me de lição.
─ Acabou tudo bem, é o que importa. Obrigado a todos. Adeus senhora escritora!
─ Obrigada inspector!
Eduardo já telefonava a Luísa a contar-lhe o sucedido.
Cristina, ao saber pela amiga que estava viúva, não pôde deixar de soltar um profundo suspiro de alívio:
─ Finalmente livre do pesadelo! Não que lhe desejasse a morte…
─ Pois é, amiga, mas também um tipo daqueles que só andava a fazer mal no mundo… Não sei como pudeste suportar esse terror durante tanto tempo. ─ concordou Luísa abraçando-a. ─ E o Daniel como se sentirá quando souber? Sempre era o pai.
─ Mas que pai! Era um ditador que só inspirava medo e ódio.
─ Eu compreendo, mas agora estás livre e vais refazer a tua vida com o Rui que é bom rapaz e gosta de ti.
─ Sim, acho que tive sorte. Ai amiga, quem me dera que ele estivesse aqui!
─ Telefona-lhe a contar.
─ Sim, é isso que vou fazer.

Continua...