Virtual Realidade

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Friday, September 14, 2007

Virtual Realidade Parte 103


Chegaram as férias do Natal e ia uma grande agitação na residência universitária. Os alunos eufóricos preparavam as malas para irem gozar aqueles dias junto dos familiares. Só ficaria algum estrangeiro que, por demasiado longe ou outro motivo, não pudesse viajar até casa.
Rita acordara muito bem-disposta e deixou-se ficar na cama a reviver os últimos acontecimentos que tinham dado um outro sabor à sua vida.
Naquele mesmo dia havia conhecido a mãe e ainda trazia no ouvido as últimas palavras dela, num tom cheio de carinho: ”Rita, tive muito prazer em conhecê-la! É muito doce e o Francisco gosta muito de si. Espero vê-la muitas vezes cá em casa.”
Depois disso, tinha-se encontrado todos os dias com Francisco.
Muitas emoções para um tão curto espaço de tempo, mas sentia-se invadida por uma enorme felicidade e, apesar do afastamento temporário do namorado e da saudade que, retrospectivamente, já sentia dele, aquele ia ser um Natal especial, junto da mãe. Tinha muitas coisas para lhe contar. A porta abriu-se e Emília entrou sorridente.
─ Bom dia, dorminhoca! Vamos lá levantar! Hoje é dia de regressares a casa.
─ Nem me fales nisso, estou num dilema! ─ fez uma breve pausa ─ uma parte de mim quer ir, a outra ficar. ─ disse com um ar tristonho.
─ Tem calma amiga! Compreendo-te perfeitamente, mas agora toca a despachar. Daqui a pouco o Francisco está aí.
─ Tem de ser, não é? Se isto tivesse acontecido mais cedo, seria a minha mãe que viria cá, mas foi demasiado em cima da hora e ela também tem o namorado…
─ Uma pausa também faz bem.

Duas horas mais tarde, Francisco foi levá-las à estação de Vitória, onde apanhariam o comboio para Portugal.
­─ É pena não podermos estar juntos neste nosso primeiro Natal! ─ disse Rita durante o trajecto.
─ O Natal é apenas uma tradição exacerbada nos últimos tempos pelas necessidades consumistas do capitalismo. ─ respondeu Francisco, porque era o que pensava e também para arranjar uma bom motivo para não se sentir tão infeliz pela ausência da namorada.
─ Mas que boa desculpa! Quer dizer que não te importas? ─ perguntou ela em tom de início de zanga.
─ Não temos outro remédio, amor, senão aceitar os factos e, Natal ou não Natal, custa-me na mesma ficar longe de ti. Ainda há poucos dias não sabíamos um do outro e agora já queremos estar sempre juntos.
─ Temos de ter calma, não é? ─ perguntou Rita, conciliadora e mais para si mesma do que para ele. ─ Também, no dia vinte sete estarei de volta.
─ Que boa notícia! Quer dizer que passas os teus anos comigo. Então é apenas um pequena separação. Serve de treino para outras maiores. ─ declarou Francisco, sentenciosamente.
─ Outras maiores?! ─ perguntou ela, preocupada.
─ Sim, repara: tu estás a começar o teu curso e vais ter de cá ficar por cinco anos; eu estou a acabar o estágio e, se decidir ir trabalhar para Portugal…
─ Pois é. ­­─ respondeu Rita, imaginando já uma separação mais longa. ─ E não preferes ficar por cá, amor? O que pensas exactamente fazer?
─ Em princípio, aqui há mais e melhores oportunidades de trabalho. O Juan quer deixar o estúdio quando eu sair e trabalhar por conta própria. Já me sugeriu que me juntasse a ele e parece-me uma boa saída, mas…
─ Nesse caso continuarias em Pamplona?
─ Pois, o problema é esse: a ideia dele é ir para Valladolid.
─ Que chato!
─ Pois, mas ele é muito experiente, conhece bem o meio, tem muito nível e é uma pessoa com quem gosto de trabalhar.
─ Claro que não, amor. E vai pensando que a tua mãe irá com ele.
─ A não ser que…
─ O quê? ─ perguntou Rita ansiosa, com uma réstia de esperança de que as coisas se resolvessem de modo a acudir a todos os interesses.
─ Há a internet e eu posso trabalhar com ele mesmo estando afastado.
─ Ou eu pedir transferência para onde tu estiveres se lá houver faculdade de medicina!
─ Mas para ti seria mais complicado! Teres de te adaptar a novo ambiente…
─ Se fores para Portugal, não seria difícil.
─ Sendo assim, eu quero voltar para Portugal, apesar de que sei que o mercado de trabalho lá está negro, porque quero muito encontrar algumas pessoas da minha família que ainda não conheço. Nem que tenha que vir a Valladolid de vez em quando trabalhar com o Juan.
Naquele momento Francisco não se achava com disposição para falar à namorada que não conhecia o pai. Queria desfrutar os últimos momentos com alegria antes de ela partir.
─ Desculpem, mas, pelos vossos projectos, já me estou a ver abandonada ─ interrompeu Emília que, até aí, se tinha mantido calada, uma vez que a conversa se desenrolava entre os dois namorados.
─ Fica tranquila que o Juan e a Mariana estarão sempre por perto. E depois podes-nos ir visitar nas férias. Eu não te esquecerei. ─ Voltando-se depois para Francisco, continuou:
─ Sabes, antes de te conhecer nem sequer pensava em namorar e agora custa-me muito viver separada de ti!
─ Eu também não andava muito preocupado com isso e agora adoraria ter-te sempre por perto.
─ Nunca namoraste antes?
─ Tive duas namoradas durante a secundária. Na universidade não tive tempo. E tu?
─ Tive um namorado na adolescência, filho de uma amiga da minha mãe, mas não deu em nada.
─ Estas revelações…
─ O que foi, não gostaste de saber?
─ Não é isso. Estava a pensar que ainda nem tivemos tempo para sabermos tudo um do outro e já vamos ter de colocar uma enorme distância entre nós. Já começo a ficar com saudades tuas e ainda aqui estás ao meu lado.
─ É melhor não falarmos de coisas tristes. Vamos falar do futuro feliz que nos espera, certamente, já não tão longe assim.
─ És optimista?
─ Sempre! E agora mais do que nunca. Tu não?
─ Sempre! E agora mais do que nunca, pela mesma razão.
─ Acharias atrevimento da minha parte pedir-te que me ligues todos os dias?
Quando Rita fez esta pergunta, aproximava-se uma área de serviço da autovia e Francisco entrou nela.
─ Não dizes nada?
─ Tem calma! Já te respondo. ─ disse ele, olhando para ela com ternura e sorrindo.
O carro estacionado, Francisco desapertou ambos os cintos, puxou a namorada para si e beijou-a apaixonadamente.
─ Olha que vamos perder o comboio! ─ disse Rita, quando conseguiu falar, sem a mínima preocupação na voz.
─ Haverá mais comboios! ─ respondeu ele, beijando-a de novo.
─ Tu paraste para me dar esta resposta?
─ Não ta podia ter dado em andamento, não achas?
─ Pensei que fosse para abastecer. Quer dizer que vamos namorar pelo telefone e pela Internet.
─ A sério que fiquei tão feliz com essa ideia que me apeteceu beijar-te logo ali quando fizeste a sugestão, mas, por razões óbvias, não podia.
─ Sabes que és um amor e te adoro?
─ Agora convenceste-me! Vamos prosseguir?
─ Vamos.
A viagem prosseguiu, como uma pequena metáfora da vida de ambos, e a conversa continuou:
─ Olha, chegámos. Vamos confirmar o horário e comprar os bilhetes.
─ Sim. Espero que tenhamos ainda um bocadinho para namorar antes de o comboio chegar.
─ Nunca me senti tão só e abandonada numa viagem com amigos! ─ lamentou Emília a brincar.
Mal tinham acabado de comprar os bilhetes, quando se ouviu anunciar que o comboio ia entrar na linha 13 rumo a Portugal.
Emília despediu-se do Francisco e foi indo á frente despachar as malas.
Os dois apaixonados estavam envolvidos a trocar carinhos quando se aperceberam o comboio começara andar.
Rita conseguiu apanhar o comboio que já estava em movimento a amiga estendeu-lhe a mão, agarrando-a pelo pulso com firmeza.
─ Ufa, foi por pouco!
Foi com o coração a transbordar de amor e esperança que Rita fez o último aceno a Francisco enquanto o comboio se ia afastando.

Continua...