Virtual Realidade

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Location: Portugal

Friday, December 14, 2007

Virtual Realidade Parte 115




Enquanto a euforia das prendas continuava a animar e a distrair as pessoas, Eduardo saiu da sala sorrateiramente e reapareceu, passados segundos, com uma rosa vermelha na mão. Aproximou-se de Luísa, que conversava com o pai, e, oferecendo-lhe a flor, disse com infinita ternura:
─ Uma flor para outra flor!
Ela pegou na rosa, sorridente, sem ocultar a emoção, e leu o pequeno cartão que a acompanhava:
“Sonho contigo!”
─ Abraça-me, abraça-me muito forte! ─ pediu Luísa, erguendo-se do sofá, feliz pela surpresa inesperada. ─ Obrigada, meu querido, gostei muito!
E os seus olhos sorriam de felicidade ao entregar-lhe também um envelope.
─ A minha prenda de Natal para ti, meu amor!
Eduardo, segurando o papel dobrado que a namorada lhe estendia, abraçou-a e as atenções gerais, atraídas por aquela contagiante manifestação de ternura, naquele dia tão especial, fizeram roda em volta dos dois apaixonados.
─ Que lindo! ─ disse Cristina comovida, olhando para o Rui, a seu lado, e aconchegando-se mais a ele.
Rita foi a única a reparar que, pelo rosto do pai de Eduardo, o único que tinha permanecido sentado, corriam duas lágrimas que ele se esforçava inutilmente por ocultar. Aproximou-se e, tomando-lhe carinhosamente as mãos, perguntou:
─ Não se sente bem, senhor António?
─ Sinto-me muito bem. Há muito que não me sentia tão feliz. Obrigado, menina!
─ Vejo-lhe lágrimas…
─ É da emoção pela felicidade do meu filho. Sabe, há muito que desejava vê-lo amparado!
─ E eu, a minha mãe ─ disse Rita, sentando-se ao lado dele.
Eduardo afastou-se de Luísa, abriu o papel e leu-o só para si. Depois, elevando o rosto, pediu o silêncio de todos.
─ Meus amigos, quero partilhar convosco este lindo poema que a Luísa escreveu para mim. Posso? ─ pediu, dirigindo-se à dona da casa.
─ Não! ─ respondeu ela com um sorriso que queria dizer que podia.
Todos os presentes esperaram atentos num silêncio de igreja.
Eduardo começou a ler:

Natal é quando o homem quiser parar e reflectir,
Estender os braços e espalhar a semente do amor.
Semear e colher os frutos com alegria.
Dizer não às guerras, à fome e ao poder.
Olhar para uma criança e sorrir.
Ser humilde e persistir em caminhar em linha recta.
Gritar bem alto até fazer eco: sou livre, é Natal!

Comovido agarrou as mãos da amada e levou-as aos lábios:
─ Obrigado, amor! Tu sabes bem do que eu realmente gosto.
“Lindo poema! parabéns Luísa!” ─ disseram os presentes em coro, batendo palmas.
Passado o momento, Rita e o pai de Eduardo reataram o diálogo interrompido:
─ E o senhor, não se sente muito só? Não sente a falta de uma companhia?
─ Não. Estou sempre acompanhado da lembrança da minha falecida esposa e tenho o meu filho quando preciso de ajuda.
─ Deve ter gostado muito dela.
─ Muito, sim! ─ respondeu, sorrindo tristemente.
─ A vida é assim.
─ A quem o diz… E a menina?
─ Eu, como? ─ perguntou a filha de Luísa, surpreendida.
─ No meio da felicidade da sua mãe e o namorado longe…
─ Ah, pois! Estou muito feliz por ela, mas estaria mais se ele estivesse aqui. ─ respondeu Rita imaginando que o senhor António sabia tudo acerca dela, o que não era verdade. Ele apenas tinha deduzido da beleza de Rita a impossibilidade de não ter um namorado, embora não visse por ali ninguém que lhe merecesse esse atributo. Eis onde muitas vezes falha a lógica normal ao não levar em conta a liberdade das pessoas, o que não era o caso.
─ Ficou a passar a noite de Natal com a família. ─ concluiu ele ─ É natural, a vida é assim!
─ Pois é verdade! ─ sorriu Rita ao perceber que ele tinha repetido a frase dela com uma expressão de intencionalidade.
─ O Eduardo sempre foi um bom menino, embora um pouco rebelde em matéria de religião e isso deixa-me um pouco desgostoso; mas larga tudo quando sabe que eu preciso dele, mesmo sem lho pedir.
─ Estou a conhecê-lo hoje pela primeira vez, mas já deu para perceber que é boa pessoa e muito simpático.
─ Não é por ser meu filho, mas é verdade!
─ Acho que ele e a minha mãe se merecem. Dá gosto, vê-la tão feliz!
─ Também a conheci só agora, mas já gosto muito dela. Na minha idade já se aprendeu a conhecer as pessoas à primeira vista.
─ Há pessoas mais difíceis do que outras. Apenas troquei umas palavras com o seu filho e parece-me que o conheço desde sempre. Já reparou que o nosso futuro vai depender do relacionamento da minha mãe com ele?
─ Principalmente o meu. ─ disse com um sorriso irónico.
Os outros continuavam a admirar as prendas, a comer os doces e a beber champanhe, e a festa continuava animada. Trocavam entre si opiniões diversas sobre o que realmente o Natal representava para cada um.
A mãe de Luísa despediu-se com um feliz natal a todos e foi-se deitar. Cristina e o namorado deixaram, logo a seguir, o ambiente acolhedor e a boa companhia para fazerem o trajecto até ao hotel onde iriam pernoitar.
─ O meu também! ─ continuava Rita, para o senhor António ─ Vou deixar de ter a minha mãe só para mim. ─ acrescentou sorrindo.
─ Mas é muito nova ainda! Tem a vida pela frente. Daqui a algum tempo casa-se e deixa de precisar tanto da sua mãe. Agora eu cada vez dependo mais do meu filho.
─ Eu estava a brincar, senhor António! Estou certa de que ganhei um amigo e de que o senhor ganhou uma filha.
─ Eu já percebi que sim.
─ E eu, não sei se sabe, estudo medicina e, quando me formar, estarei do seu lado quando precisar.
─ Muito obrigado! ─ concluiu o pai de Eduardo com a voz embargada pela comoção perante a oferta de Rita, olhando-a enternecido.
Nesse momento Luísa aproximou-se dos dois e disse:
─ Tenho vindo a reparar que têm estado os dois em amena cavaqueira! Espero que não tenham falado mal de mim.
─ Pois foi isso mesmo que aconteceu mãezinha! Eu e aqui o senhor António combinámos unir-nos quando formos vítimas do vosso esquecimento. Sim porque tu e o Eduardo vão com certeza esquecer-se de nós. Só têm olhos um para o outro. É, ou não é verdade? ─ Rita elevou a voz ao fazer a pergunta, atraindo a atenção dos presentes na sala.
Luísa chamou o namorado e disse-lhe de modo que todos ouvissem:
─ Meu querido, a minha filhota e o teu pai acabaram de se associar para se defenderem do esquecimento a que dizem que os vamos votar.
─ Não imaginava o meu pai ciumento da felicidade do filho! ─ exclamou Eduardo a sorrir.
─ Nem eu a minha filha! O que vamos fazer agora, amor?
─ Vamos dormir que o nosso mal é sono! Pelo menos o meu é. ─ disse o senhor António, antecipando-se à resposta do filho. E, emocionadíssimo, acrescentou: ─ Obrigado meu filho, por me teres trazido para o seio desta boa família da qual já me sinto a fazer parte. Esta noite ganhei uma filha e uma neta. Aqui a Ritinha, ─ acrescentou tratando-a carinhosamente pelo diminutivo, pela primeira vez ─ que vos conte a nossa conversa. ─ depois, dirigindo-se a Luísa: ─ Parabéns pela filha que tem! Se me dão licença, retiro-me para o meu quarto. Feliz Natal para todos!
O pai de Eduardo recolheu-se ao quarto que lhe havia sido destinado. O dia para ele tinha sido longo e repleto de emoções.
─ Eu também gostaria de ir, se não te importas.
─ Sim, meu amor, acompanha o teu pai. Eu já irei em seguida.
Aquela tinha sido a deixa para que todos notassem que precisavam de dormir. Os jovens seguiram para casa de Daniel e em poucos minutos a sala ficou vazia. Luísa verificou as portas e apagou as luzes. Era já dia de Natal.

Ao entrar no quarto, Eduardo esperava-a na cama. Arrancou as roupas rapidamente e aconchegou-se, nua, no espaço que ele lhe abria debaixo dos cobertores. Sem nada falarem, os seus corpos encontraram-se numa paixão de adolescentes, enroscando-se um no outro, até que o sol os veio surpreender estendendo até à cama os seus longos braços luminosos, introduzidos pelas fendas dos estores mal fechados, prometendo-lhes um dia radioso, em que a chuva tinha dado lugar a um céu completamente liso, mas frio.


Continua...